Por Paula Vicente e Rafael Colli

“Não temos tanto dinheiro assim, precisamos priorizar”, brada o banqueiro do Governo. “Gastamos demais com o povo e com coisas desnecessárias, como remédios”, complementa. O gerente de um grande laboratório interrompe e diz, “melhor seria priorizar os remédios de baixo custo e deixar os de alto custo para os ricos. Pobre não pode ter vez sempre”. Todos batem palmas. “Que morram os pobres e necessitados, precisamos fazer o país crescer”.

Nesta semana, o Governo Federal anunciou a suspensão da produção de 19 medicamentos, dentre eles medicamentos para câncer, diabete, Parkinson, entre outras doenças, e, até, medicamento para receptores de transplante.

O argumento do Governo foi que as parcerias para produção dos medicamentos – as chamadas PDP (Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo), nas quais laboratórios privados repassam a tecnologia para laboratórios públicos poderem produzir o remédio a menor custo para o Estado – não teriam cumprido os cronogramas. No entanto, chama atenção o fato de que muitas das parcerias suspensas não haviam, sequer, iniciado a produção do remédios.

O Governo Federal, ainda, anunciou que não haverá solução de continuidade no fornecimento destes remédios, pois o Ministério da Saúde irá adquiri-los por outros meios legais, como licitações, pregões ou compras diretas.

O que se percebe, então, é verdadeira troca da produção pública e sua consequente distribuição gratuita, pela compra dos mesmos remédios de instituições privadas.

Mas o que, afinal, este fato tem a ver com esta coluna, que trata de Direitos Humanos? Primeiro, é um assunto que interessa, ou deveria, a todos seres humanos que habitam este pequeno planeta esférico (ou elipsoidal, se quisermos ser mais técnicos).

Mas, principalmente, dentre o rol de Direitos Humanos lá está o Direito à Saúde, como um dos mais importantes. Isso implica no Dever do Estado de proporcionar todas as condições para que o ser humano possa viver com saúde, isso inclui hospitais, claro, mas também remédios. E de graça. Sim, caro leitor, é necessário que o Estado garanta saúde de qualidade e sem custo, ao menos para atender o essencial – lembrando que essencial aqui, significa o essencial para se viver com dignidade.

Pois bem, caro amigo, ao suspender a produção de medicamentos, o Governo Federal automáticamente põe em risco todos aqueles que estão, atualmente, em tratamento. Veja bem, mesmo que o Governo compre os remédios e os distribua gratuitamente, quem assegura que a compra, que deverá ser feita por meio de pregão ou outro modo formal, será rápida o suficiente para não prejudicar os tratamentos? E se a partir do próximo orçamento estes remédios, que já não são produzidos, não estiverem previstos como essenciais à vida do cidadão? O que será dos pacientes que usam estes medicamentos e não têm dinheiro para comprá-los.

Alguns dos remédios suspensos chegam a custar mais de R$ 10.000,00, e são essenciais para a vida daqueles que deles dependem. Ora, o que importa mais? O lucro da indústria farmacêutica ou a vida do cidadão que depende de tratamento para sobreviver?

A suspensão das PDP´s nos soa muito estranha, como a maioria das medidas tomadas nos últimos 200 dias. Não há estudo que comprove o impacto da suspensão da produção desses medicamentos pelo Governo Federal, não há, em verdade, justificativa plausível para tal medida, nada que salte aos olhos, além do oculto intuito de contribuir para o lucro das empresas farmacêuticas.

Muito interessante lembrar que a emergência é uma das poucas hipóteses de dispensa de licitação previstas em lei, ou seja, caso demonstrada a emergência para a compra, pelo poder público, de determinados medicamentos, não há necessidade de realização de concorrência licitatória, seja qual for a modalidade, entre as empresas que o produzem.

O que isso quer dizer na prática? Que o governo pode escolher de quem comprar, sem os trâmites licitatórios e a concorrência habitual, ou seja, o governo pode escolher beneficiar x ou y com a compra dos medicamentos.

Agora é com você, leitor, o que lhe parece?

Qual foi o objetivo do Governo com essa suspensão? Otimizar o serviço público? Melhorar a vida e a dignidade do usuário? Ou seria forçar aqueles que dependem desses remédios a comprá-los com o dinheiro de suas aposentadorias (se acalme, logo falaremos desse assunto)? Ou, até mesmo, comprar os medicamentos sem licitação, já que, a população pode morrer sem insulina, por exemplo, o que gera emergência.

Há muitas perguntas pairando… mas cabe mais uma bem importante aqui: qual a prioridade dessas medidas e desse Governo? Nós ou as empresas?

Bom, parece que começamos a entender o que o Presidente queria dizer quando afirmava que Direitos Humanos não teria espaço em sua gestão: é porque este é um Governo virado para empresas e dinheiro.

E que morram os pobres e necessitados, o que importa é lucrar!

*Esta coluna é publicada quinzenalmente

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