*Por Paula Vicente e Rafael Colli, integrantes da Comissão de Direitos Humanos da OAB/Londrina
Na coluna passada, falamos sobre crise climática. E faz todo sentido, pois um meio ambiente equilibrado é um direito humano, essencial para nossa existência. Infelizmente, precisamos retomar o assunto em razão da tragédia ambiental que nos assola.
Há algumas semanas, os jornais brasileiros têm acompanhado um derramamento de petróleo cru nos mares do Nordeste. Todos os estados nordestinos foram afetados. Os danos, ainda, são desconhecidos – ou pouco calculados.
O que se sabe, por hora, é que o óleo foi derramado por algum navio que cruzou os mares brasileiros e que o petróleo, provavelmente, é de origem venezuelana. Infelizmente, as ações do Estado brasileiros param por aí: em descobrir a origem do petróleo – não, não descobriram quem derramou, apenas que o petróleo foi extraído dos solos ou mares da Venezuela.
Esperava-se, na realidade, uma grande ação de contingenciamento – me desculpem os curiosos, a investigação pode esperar, o que não pode esperar é a natureza e as milhares de pessoas que dependem do oceano para viver. Mas não. Todo o trabalho de limpeza e recuperação das áreas afetadas ficou para os estados nordestinos, que são, em sua maioria, estados com pouco suporte financeiro, e, claro, para as populações desses estados.
As pessoas estão tirando o óleo, literalmente, com as próprias mãos. Enquanto isso, o ministro do meio ambiente e o próprio presidente continuam disparando inverdades e fake news, atacando ONGs e o país vizinho, como se o óleo fosse desaparecer assim, com algumas palavras de ataque.
O assunto é muito sério, e abre uma gama de debate importantíssima para todos nós. Qual o verdadeiro preço da exploração de fontes de energia não renováveis? Qual o preço do petróleo? E quanto tempo mais será necessário para percebermos que este modelo de produção e desenvolvimento está matando nossa população e nosso planeta?
A exploração e comércio do petróleo é uma das principais atividades comerciais do mundo, gerando, inclusive, guerras. Acontece que o “ouro negro” é fonte não renovável de energia, ou seja, uma vez que a gastamos, ela não retorna à natureza. Mas este sequer é o ponto mais grave da exploração do petróleo: a queima do petróleo e seus derivados libera gases causadores do efeito estufa, que contribui para o aquecimento global.
Dos plásticos que matam animais mundo afora aos combustíveis que alimentam nossos veículos e poluem nossos ares, tudo tem como fonte de produção o petróleo.
Para que seja possível, então, a diminuição dos efeitos da crise climática, o planeta deve alterar sua fonte energética para fontes sustentáveis e de menor impacto. Esse, caros leitores, é um dos objetivos de desenvolvimento sustentável da agenda 2030, um pacto do qual todos os Estados membros das Nações Unidas são signatários, ou seja: todos os 193 Estados-Membros da ONU assumiram um compromisso para que sejam tomadas, urgentemente, medidas transformadoras para um desenvolvimento sustentável.
Essa transformação de exploração energética e de produção é, repita-se, essencial para que os objetivos dos pactos globais pelo meio ambiente sejam atingidos e, assim, para que continuemos a existir. Sim, esta é a gravidade do tema.
Portanto, fontes de energia limpa e acessível devem ser exploradas e incentivadas pelos governos de todos os Estados-Membros da ONU. Para tanto, é necessário maciço investimento em pesquisa e tecnologia, mas essa, meu amigos, não é nem de longe uma preocupação do nosso atual mandatário. Avesso à ciência, vive atacando as universidades e pesquisadores, com cortes de investimento e palavras de desdém. Como vocês podem ver, um assunto puxa o outro, são tantas as barbaridades que temos que enfrentar ultimamente, fica bem difícil nos concentrarmos em um problema só.
Como o assunto agora é outro, deixemos a falta de investimento na educação para outro momento…
O que importa aqui é que, além de ignorar os esforços necessários para garantir um desenvolvimento sustentável e um futuro a todos nós, o governo brasileiro e outros governos liderados por conservadores “Trumpistas” – o New Fascismo – se preocupam apenas com o crescimento econômico – de uma parcela do país, diga-se de passagem. Custe o que custar.
No Brasil, o governo permite a queimada de nossas matas e o envenenamento de nossos alimentos, tudo em prol de um fajuto crescimento econômico. Cabe aqui, para lembrarmos mais uma vez de nossa coluna anterior, parte do discurso de Greta Thunberg, a menina de 16 anos que abalou o mundo algumas semanas atrás: “Nós estamos vivenciando o começo de uma extinção em massa. E tudo o que vocês fazem é falar de dinheiro e de contos de fadas sobre um crescimento econômico eterno”.
O que importa para estes líderes é que seu grupo esteja ganhando dinheiro e que seus inimigos – que normalmente são eleitos também com algum intuito econômico – sejam derrubados. É isso: o óleo foi derramado e está devastando nossos mares desde 30 de agosto. A primeira manifestação oficial do governo, entretanto, só ocorreu em 27 de setembro – 28 dias depois de constatado o derramamento de óleo. E as medidas necessárias para conter o avanço do óleo, previstas no Plano Nacional de Contingência de Incidentes com Óleo (PNC) somente foram tomadas 17 dias depois da primeira nota oficial, ou seja, 45 dias depois do início do desastre.
Mas, sabem qual plano já havia sido posto em prática? Sim, a culpabilização do inimigo. Constatada a semelhança do petróleo encontrado no mar brasileiro com o venezuelano, o chefe de Estado e Governo brasileiro, e seus ministros, iniciaram um ataque coordenado com o intuito de culpar a Venezuela, um dos inimigos eleitos.
Enquanto isso, as pessoas, que deveriam ser protegidas pelo governo, estão tendo que limpar as praias nordestinas para sobreviverem. Mas não se enganem, aquelas pessoas que estão tirando petróleo do mar usando as próprias unhas não são heroínas, são pessoas vítimas. Vítimas de um governo que as negligenciam e que estão vendo sua fonte de subsistência ruir; vítimas que ou limpam o óleo ou passam fome.
E tudo isso devido a um modelo de desenvolvimento ultrapassado – ou ao menos que deveria ser superado – em uma ânsia por riqueza descontrolada. Trocamos nosso bem-estar e sobrevivência por bens materiais e poder. Este é o verdadeiro significado do petróleo. O sangue negro que corre em nossas veias desumanas e gananciosas.
Deixe uma resposta