Mãe de aluna reclama de “bando de vagabundos” que apresentou a “porcaria de uma palestra”; na verdade, era peça do FILO

Nelson Bortolin

Em 2016, a peça ‘O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu’, que retratava a história de Jesus como uma transexual, virou escândalo em Londrina. Era a estreia nacional do espetáculo no festival internacional de teatro, o FILO. Na edição de 2017 do evento, uma performance em que o ator aparecia nu dentro de uma bolha de plástico terminou na delegacia, após denúncia feita pela população.

Para comprovar que Londrina tornou-se a capital nacional do obscurantismo, nesta terça-feira (5), ‘cristãos’ tentaram realizar uma espécie de Marcha da Família com Deus, comum em 1964, em apoio ao golpe militar. Seria em frente ao Colégio Hugo Simas, no centro da cidade. Mas a chuva despencou e espantou os poucos manifestantes que se reuniram no local.

De novo, o motivo da indignação era uma peça do FILO. A montagem ‘Quando quebra queima’, com classificação indicativa para pessoas com 10 anos ou mais, havia sido apresentada para alunos do ensino médio do colégio dia 1º de novembro. O espetáculo foi concebido por artistas e ex-alunos secundaristas que participaram do movimento de ocupação de escolas de São Paulo em 2015. Já foi exibido em várias cidades brasileiras, em Portugal e na Inglaterra. Só deu problema por aqui.

Uma mãe de aluno postou vídeo em rede social se dizendo estarrecida porque a filha teria sido obrigada a assistir uma “porcaria de uma palestra”, na qual um “bando de vagabundos” gritavam o nome da vereadora assassinada do Rio de Janeiro, Marielle Franco e se rebelavam contra a escola e a Polícia Militar.

E, como se não bastasse, a peça terminou com cenas de “homossexualismo”. “Os atores começaram a se beijar. Homem beija homem? Como é isso?”, reclamou a mãe.

O vídeo viralizou atraindo a ira dos conservadores londrinenses, muitos deles com telhado de vidro, para a direção e os professores do Colégio Hugo Simas, o mais antigo da cidade. A direção da escola divulgou nota ressaltando que o teatro vai ao encontro do projeto pedagógico da instituição. “A apresentação procurou trabalhar a questão das juventudes, da valorização da diversidade, do acesso à educação, dentre outros temas importantes na formação dos jovens na atualidade”, diz a nota.

Destacou também que o pluralismo de ideias está previsto n Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lembrou ainda que uma lei estadual instituiu o dia de combate à homofobia no Paraná.

O FILO divulgou nota a respeito do caso, ressaltando que o artigo 5º da Constituição garante a liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. “Os realizadores da Mostra Nacional de Artes Cênicas – FILO 50+1 vêm a público defender o direito assegurado pela Constituição Federal e declarar sua posição contra toda e qualquer manifestação de censura, violência, racismo, homofobia, intolerância ou outro tipo de preconceito.”

Apesar da chuva ter atrapalhado o protesto dos conservadores nesta terça-feira, o assunto vai continuar sendo explorado como escândalo por políticos e outros tipos oportunistas da cidade.

O teatro não é nenhuma novidade para o londrinense, ou não deveria ser. Afinal de contas, em seus 50 anos, o FILO levou milhares de peças aos teatros, bares e espaços públicos da cidade. Mas, infelizmente, tem muita gente que ainda não sabe diferenciar um espetáculo de uma palestra. Prova de que estamos na vanguarda do atraso.

Pobre Londrina.

3 respostas para “Ira dos conservadores se volta contra o Colégio Hugo Simas”

  1. O termo “homossexualismo” não existe desde 1960. Deveriam ao menos saber escrever pra poder trabalhar com jornalismo. Se eu tivesse que dar uma nota pra esse amontoado de palavras, seria dó.

  2. Ultimamente está dando vergonha de morar em Londrina com tanta vontade de retroceder no tempo e voltar pra Idade Média desse povinho que aqui habita. Todo o apoio à direção e equipe pedagógica do colégio, onde estudei com muito orgulho.

  3. Não vejo problema algum quanto a realização da peça ou mesmo uma palestra com esses temas, o problema na verdade é impor que um aluno ou qualquer que seja o indivíduo, a participar desses eventos utilizando-se de argumentos que o pressionem.

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