Por Paula Vicente e Rafael Colli, integrantes da Comissão de Direitos Humanos da OAB

Pedimos licença a Marcelo Rubens Paiva, para utilizarmos como título da primeira coluna do ano o título do seu livro mais famoso, mas não há nada que se encaixe mais ao momento que vivemos. 

Já se passaram 23 dias do novo ano e, toda aquela euforia da virada, a esperança de que esse ano será melhor do que aquele que passou, foram por água abaixo. 2019 foi um ano a ser esquecido em todos os sentidos, mas, principalmente no que tange à luta por direitos e os direitos humanos. Foram inúmeros os absurdos e violações cometidos, e, pelo visto, 2020 será uma segunda temporada dessa série de mau gosto na qual estamos inseridos.

O ano passado não deixou saudades. Vimos nossos direitos e conquistas serem violados e suprimidos; vimos chefe de Estado enaltecer a tortura; dizer impropérios acerca de adolescentes engajadas; disseminar “fake news” e o ódio sem o menor pudor. Na América Latina vimos movimentos diversos de golpes contra democracias e retomada do poder pelo povo. No Brasil, o ano passado foi o ano da Necropolítica; da retomada do Fascismo velado e enrustido, escondido sob o manto do discurso “anti-corrupção”; foi o ano de Evaldo, de Agatha, de Paraisópolis. Foi um ano a ser esquecido.

2020, no entanto, não parece querer ficar atrás e, em 23 dias de ano novo, já tivemos ataques mútuos entre potências nucleares – gerando a ameaça de termos novamente uma grande guerra -, incêndios que destroem um país inteiro, e secretário plagiando propaganda nazista em vídeo oficial – escancarando a verdadeira face da Necropolítica Bolsonarista.

Mas, será que devemos mesmo nos preocupar com isso? Ou será que a Sociedade exagerou um pouco nas reações contra o agora ex-Secretário adorador de Hitler?

Neste sentido, lembra-se que os Direitos Humanos como conhecemos só existe frente à desumanidade do Nazifacismo. Foi após os horrores da II Guerra Mundial e das barbáries de Hitler e companhia que se forjou a Declaração Universal dos Direitos Humanos. E não foi à toa. Pessoas foram mortas aos milhões, pelo simples fato de existirem, serem, pensarem, professarem alguma religião, por sua orientação sexual ou ideológica, enfim mortas como moscas, forçadas a trabalhos extenuantes, privadas de alimentação e outras tantas iniquidades.

Tudo isso começou de uma maneira sutil, inicialmente o regime dizia que valorizaria a nação, a família; elegeu inimigos a serem combatidos e iniciou campanha ferrenha para desumanizar tais inimigos. Foi assim, com propaganda, controle das mídias, e da produção artística do país, que os nazistas convenceram a população alemã a apoiar os crimes cometidos durante o Terceiro Reich. Grande parte do povo alemão concordava com o que estava sendo feito por acreditar que aqueles que estavam sendo mortos, torturados, dilacerados eram seres humanos indignos, de segunda classe.

Foi a construção de uma ideia de superioridade que levou a Alemanha a permitir que Hitler dominasse e destruisse parte do mundo.

É o que parece pretender o (des)governo de Jair Messias Bolsonaro. Assim venceu a eleição: criando no imaginário da população que seus inimigos (a esquerda) levaram a nação brasileira à derrocada moral; assim mantém seu governo: combatendo esses inimigos (inclusive, os mesmos inimigos que Hitler, 85 anos atrás, combatia); assim institui seus programas de governo e seus ministérios: com fortes propagandas nacionalistas, desnudas de elementos que não sejam “puros” e puritanos; Alvim apenas se empolgou demais e deixou transparecer a real inspiração de toda a corja desde governo nazi-fascista tupiniquim.

Os passos, infelizmente, estão sendo dados. Talvez, a queima de livros não seja explícita, mas ocorre, ideologicamente, todos os dias, seja pela proibição de circulação de alguns livros por seu conteúdo moral; seja por terem “palavras demais”. O governo federal – e seus seguidores estaduais – censura, diariamente, a arte, o pensamento e a ideologia que afronta seus ideais eugênicos. Alvim, em um ato de sinceridade fatal, tão somente anunciou oficialmente sua prioridade.

Alvim não é o verdadeiro inimigo, assim como Goebbels não era. Alvim tão pouco foi um ponto fora da curva. Alvim é apenas mais um que idolatra monstros e torturadores. Seu chefe continua lá, brincando de fuhrer, enquanto nossa população é massacrada diariamente e nossos direitos, intrínsecos à nossa condição de humanos, exterminados.

2020 já começa com um terrível sentimento de fim; sem esperança; sem sentido; sem futuro. Lutemos para sobreviver; lutemos para que nossa humanidade ainda permaneça como condição de dignidade; lutemos para que este ano não morramos mais uma vez, como morremos ano passado.

Uma resposta para “Feliz Ano Velho”

  1. […] via Feliz Ano Velho — Lume – Rede de Jornalistas Independentes […]

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