Grupo realiza protestos em Londrina e Cambé por mudanças na entrega das sacolas, mais acesso a informações sobre os presos e pautas atemporais, como superlotação e opressão nas cadeias
Cecília França
Familiares de detentos de Londrina e Cambé realizam protestos desde a última semana em frente às unidades prisionais. Com faixas, eles pedem, de imediato, mudanças no sistema de envio da sacola quinzenal aos detentos, liberação de presos de alto risco à Covid-19 e mais acesso a informações sobre o estado de saúde dos detidos. As participantes – sobretudo mulheres (mães, irmãs, esposas) – também levantam pautas atemporais, como fim da superlotação e da opressão nas cadeias.
Como forma de prevenir a entrada do novo Coronavírus nas unidades, o Departamento Penitenciário do Paraná (Depen) suspendeu as visitas presenciais em 20 de março em todo o Estado. As sacolas, que podem ser enviadas a cada 15 dias com itens não oferecidos pelo sistema prisional (comidas diferenciadas, roupas, cobertores, entre outros), agora devem ser mandadas por Sedex.
Priscila de Quadros, 36, organizadora dos protestos, explica que muitas famílias não têm condições de arcar com os custos deste envio e que, quando chegam, muitos produtos já estão impróprios para consumo. “A gente queria que voltasse a sacola normal. Além de ter que ficar pagando um preço absurdo as coisas não estão chegando. E tem a demora. A gente sempre manda pão, chega tudo embolorado”, afirma ela, que tem um irmão de 27 anos na Penitenciária Estadual de Londrina I (PEL I).
Viviane da Silva Novaes, 39, tem dois filhos na PEL II, de 20 e 22 anos, e outro na Casa de Custódia, de 18. Ela diz que gostaria de poder voltar a levar a sacola na porta das unidades, com horário agendado. “O debate não é pela visita agora, a gente quer que tudo se resolva primeiro. Mas semana passada eu paguei 66 reais de Sedex. Se mandar bastante coisa é quase 100 reais. Eu trabalho na limpeza, tenho seis crianças em casa, não posso cobrir um santo para descobrir outro”, argumenta.
Viviane diz não ter notícias dos filhos desde março, quando as visitas foram proibidas. De acordo com ela, as unidades prisionais não passam informações por telefone e eles não têm advogados particulares.
“Desde quando começou a pandemia não visito. É terrível porque é um pedaço de mim que está lá dentro e não poder saber como estão, se está bem, se está comendo, é difícil”
O coordenador regional do Depen, Reginaldo Peixoto, diz que todos os setores das unidades estão trabalhando, inclusive o de assistência social. Ele esclarece que não existe a possibilidade, no momento, de alteração no protocolo de envio das sacolas, que está valendo para todo o Estado.
“A gente entende essa questão dos valores, mas o nosso objetivo primeiro hoje é fazer com que o Coronavírus não venha para dentro das unidades penais. A gente está adotando essas medidas e vem dando certo”, afirma. As visitas virtuais tiveram início no último fim de semana em Londrina, diz Peixoto, e não há necessidade de nenhum equipamento específico para a conversa, basta um celular.
“Os presos estão fazendo os contatos no serviço social e tem agenda. Já funcionou nas três unidades de Londrina. Tem que ser respeitados bem os horários, porque é um atrás do outro”, esclarece. Peixoto afirma estar disponível para conversar com as famílias.
Atualmente, a lotação das unidades prisionais de Londrina encontra-se entre 10% e 15% acima da capacidade. A PEL I tem 740 detentos; PEL II, 1.230; Casa de Custódia, 600; Centro de Reintegração Social (Creslon), 380; 3º Distrito (Carceragem Feminina), 102 e 4º Distrito, 96.
Priscila diz que a soltura de presos de risco para Covid-19 é outra pauta dos protestos. De acordo com ela, muitos têm HIV, pneumonia, entre outras doenças pré-adquiridas que podem levar a maior risco de letalidade.
O coordenador regional do Depen diz que apenas detentos em estado grave, alguns internados, foram liberados e que não há previsão de mais solturas. “Casos muito graves são analisados individualmente”, informa.
Medo da opressão
Opressão por parte das forças de segurança nas unidades prisionais é outro temor relatado pelas famílias. “No dia da manifestação a SOE estava lá”, diz Viviane, para quem, quando o Serviço de Operações Especiais do Depen é acionado “o bicho pega”.
Já Priscila diz que a opressão aumentou após o início da pandemia e teme que o isolamento ainda mais rígido impossibilite as denúncias. “Na visita virtual eles vão estar sendo monitorados, se estiverem sendo agredidos não vão falar”, teme.
Na opinião da advogada criminalista de Londrina Nayara de Andrade Vieira as punições para agentes de segurança por casos de agressões são raras, embora os excessos sejam recorrentes.
“Confesso que até hoje não vi ninguém ser criminalizado pelas torturas/agressões e opressão dentro dos presídios”, lamenta. Ela relata que desde seu primeiro contato com clientes presos, há três anos, sempre recebeu denúncias.
“Alegam que são humilhados, passam por situações vexatórias, apanham, são torturados. Infelizmente ainda existem tratamentos cruéis, diverso do que garante a Constituição Federal”.
Em 10 de março a advogada fez uma publicação em suas redes sociais em que denunciava opressão na PEL I e na PEL II por parte da SOE e do Choque, da Polícia Militar. As fotos mostravam ferimentos de balas de borracha em várias regiões do corpo dos detentos.

“Eu compartilhei porque sei que muitas decisões são políticas e a pressão do mundo externo faz com que se chegue a um resultado. Como advogada, recebi de clientes aquelas imagens. Para não expor um a um, fiz uma denúncia genérica. Até onde sei, depois daquele ocorrido, nunca mais teve nada semelhante em Londrina”, conta.
As denúncias sobre este caso levaram à abertura de procedimentos administrativos por parte do Depen e da Polícia Militar, de acordo com o coordenador regional do departamento penitenciário, Reginaldo Peixoto. Ele explica que os procedimentos de revista são feitos, normalmente, pela SOE, mas que em março houve uma operação conjunta com a PM. Ele informa que os procedimentos administrativos em andamento para “averiguar se houve excessos” atrasaram devido à pandemia.
Ressocialização
Priscila de Quadros argumenta que as famílias focam na ressocialização dos detentos, mas que com a superlotação e a falta de opções para remissão das penas inviabilizam novas possibilidades de vida.
“A gente reconhece que eles erraram, mas nosso ponto é que eles sejam realmente ressocializados; dessa forma não tem jeito”.
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