Artistas e produtores culturais pedem medidas urgentes do poder público para garantir sobrevivência na pandemia; secretaria aponta continuidade da política de financiamento
Cecília França
“Londrina pulsa cultura e arte”. A frase constante no manifesto escrito e falado do Fórum Permanente da Cultura expressa a pura realidade da cidade, dos grandes festivais à arte exibida e vendida nos calçadões. Mas essa cultura encontra-se asfixiada. Precisa urgentemente respirar. Há quatro meses não se tem shows com público, não se tem teatro, não se tem música ao vivo nos bares, não se tem rodas de histórias. A pandemia do novo Coronavírus, que nos abrigou ao isolamento, imobilizou grande parte da economia criativa.
Algumas atividades possíveis estão sendo desenvolvidas nas plataformas digitais, a partir, principalmente, da adaptação de projetos anteriormente aprovados pelo Programa Municipal de Fomento à Cultural (Promic). Outras, simplesmente aguardam o retorno à normalidade, sabe-se lá quando. “Vivemos com nosso público. Subsistimos do nosso trabalho. Fomos os primeiros a parar e seremos os últimos a voltar”, diz o vídeo-manifesto, um quase jogral suplicante por medidas emergenciais.
O manifesto foi entregue ao prefeito, Marcelo Belinati, e ao secretário da Cultura, Caio Cesaro, no último dia 14, com quase 400 assinaturas. As principais medidas requeridas são: lançamento de edital emergencial para pessoa física com recursos do Fundo Especial de Cultura; não contingenciamento do orçamento da Cultura e participação na gestão dos recursos da Lei Aldir Blanc no município.
O presidente do Conselho Municipal de Cultura, Edvaldo dos Santos Junior, classifica a situação dos profissionais da área como “de muita angústia”. De acordo com ele, as conversas com a secretaria de Cultura vêm acontecendo há alguns meses e, na última quinta-feira, o Conselho apresentou uma contraproposta para a liberação de recursos, a fim de contemplar, em caráter imediato, projetos de pessoas físicas.
“A secretaria já trabalhou numa minuta de edital e ele já passou pela nossa procuradoria jurídica, mas não foi lançado por conta do contingenciamento. De abril para maio, R$ 2,4 milhões foram contingenciados. Esses editais que a gente estava pleiteando era da ordem de R$ 1.050 milhão, que está nesse bojo”, explica. O contingenciamento foi justificado pela Secretaria da Fazenda como necessário em função da queda na arrecadação do município em 2020, estimada em cerca de R$ 100 milhões.
Santos Junior não acredita em um retorno às atividades presenciais do setor em 2020. “A gente já está passando de quatro meses de pandemia com todas as atividades paradas, tudo suspenso, é um cenário de muita angústia, de muita incerteza, para todos os produtores, proponentes, agentes culturais”, define.
Ele sente na pele a dificuldade. Dono de uma produtora cultural, teve todos os projetos, contratos e agendas suspensos da noite para o dia. Um outro trabalho fixo tem garantido seu sustento. “Felizmente ficou um mínimo de trabalho que garante pagar o aluguel para morar e uma compra para comer”.
Importância econômica
O manifesto do Fórum de Cultura destaca a importância econômica do setor: “Geramos três empregos enquanto, com o mesmo recurso, outros ramos da economia geram um posto de trabalho”. A arte e a cultura movimentam, ainda, os setores hoteleiro e de transporte, especialmente quando da realização dos grandes festivais, em Londrina.
A poeta Flávia Quintanilha destaca que este impacto da economia criativa passa despercebido para a população. Ela classifica a situação atual dos profissionais como “catastrófica, penosa”. “Este setor teve que parar imediatamente, então existem projetos que foram aprovados, receberam seu valor, mas tiveram que esperar porque não pode fazer uma peça de teatro, um show em época de pandemia”.
“Nós temos relato de profissionais que tiveram que vender seus instrumentos, como um meio de sobreviver e de pagar as contas”.
A artesã Teresa Mendes participou da entrega do manifesto ao prefeito. Para ela, o maior desafio está em fazer os recursos chegarem a quem está na ponta. “Não tem como inserir artesãos em shows virtuais. A realidade é que o artesão vai produzir para trocar na porta do mercado”, afirma.
Teresa recebeu o Auxílio Emergencial do Governo Federal, que ajudou, mas não resolveu a situação de dificuldade. Antes da pandemia ela costumava comercializar seus produtos nos calçadões do Centro e da UEL. “Ainda estou bem porque não pago aluguel. A questão é que mesmo na Aldir Blanc eu não acredito que chegue no artesão”, lamenta.
A Lei Federal Aldir Blanc (14.017/2020), lançada em junho estabelece uma ajuda emergencial para artistas, coletivos e empresas que atuam no setor cultural e enfrentam dificuldades durante a pandemia. De acordo com a lei, R$ 3 bilhões serão distribuídos para Estados e municípios. O nome da lei é uma homenagem ao compositor Aldir Blanc, morto em maio, vítima de Covid-19.
Atuação do município
O secretário de Cultura, Caio Cesaro, diz que a secretaria vem se preparando para a implantação da Lei Aldir Blanc em Londrina. Caberá ao município a operacionalização completa das modalidades de apoio II (subsídio emergencial mensal) e III (editais, prêmios). A modalidade I, que é a Renda Emergencial Mensal, ficará à cargo do Estado.
“Nesta modalidade de apoio, o município terá um papel na divulgação do cadastramento e na busca ativa daqueles que se enquadram nos critérios da Lei”, destaca. Cesaro diz que a política cultural de Londrina – que tem no Promic sua espinha dorsal – vem tendo continuidade neste momento de pandemia.
“O Promic segue investindo recursos públicos nos projetos aprovados nos editais de seleção. Somente em 2020, o Fundo Especial de Incentivo a Projetos Culturais (FEIPC) já repassou, até julho, R$ 2.713.463 milhões”, contabiliza. Dentre medidas importantes tomadas no decorrer da pandemia, Cesaro elenca a possibilidade de adaptação de projetos para os meios virtuais.
“Com isso, várias ações culturais estão sendo oferecidas aos londrinenses, nas plataformas digitais, como vídeos no Youtube e Facebook, podcasts transmitidos on-line, entre outros”.
Quanto ao orçamento da secretaria para 2021, Cesaro prevê uma redução em relação a 2020, quando o montante foi de R$ 14 milhões. “A perspectiva é de queda na arrecadação do município para o ano que vem. Neste sentido, a Secretaria de Cultura será também um dos órgãos impactados, com redução em seu orçamento”, afirma.
“A primeira estimativa (de orçamento da cultura) para 2021 é de 10,8 milhões”.
O orçamento do município ainda está em fase de elaboração.
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