Inquérito Policial Militar (IPM) resultou na prisão de Ricardo Helbel; medida foi revogada por juiz que a considerou grave violação de garantias fundamentais
Nelson Bortolin
Após questionar escalas de trabalho exaustivas e uso de munições fora das recomendações de segurança do fabricante, o policial militar Ricardo Henrique Helbel, de Iguaraçu (região metropolitana de Maringá), afirma que passou a ser perseguido pela corporação e precisou dar início a tratamento psiquiátrico.
Foram abertos 14 procedimentos contra ele, sendo que um culminou na prisão do policial no dia 11 de outubro, sob acusação de “patrocínio indébito”, crime previsto no artigo 334 do Código Penal Militar.
O Inquérito Policial Militar (IPM) teve início em denúncia de “captação de clientes” feita por ex-advogados de Helbel e dos familiares dele.

Esses advogados, que o PM conheceu num curso de pós-graduação, alegam que tinham uma sociedade com ele, que indicava clientes para o escritório, o que configuraria o delito previsto no Código Militar.
Helbel nega sociedade e diz que os advogados representaram familiares dele em ações diversas, entre elas processo relacionado ao direito do consumidor e até um divórcio. A denúncia teria acontecido, como forma de retaliação, após os familiares do PM terem trocado de escritório.
O policial, que é formado em direito, nega que cometeu qualquer irregularidade usando-se da sua condição de PM. “Apenas indiquei os advogados para meus familiares. Isso não é captação de clientes.”
No transcorrer do inquérito, foi determinada uma menagem do policial. Trata-se de medida cautelar de restrição de liberdade prevista no Código Militar. A justificativa para a penalidade é que o PM havia faltado em audiências do processo.
Além disso, a corporação alega que Helbel não compareceu para cumprir a menagem e não forneceu sua localização. Devido a esses fatores, no dia 11 de outubro, a prisão preventiva do PM foi decretada pela juíza da Vara da Auditoria da Justiça Militar Criminal de Curitiba, Carolina Marcela Franciosi Bittencourt.
A história contada por Helbel é bem outra. Ele garante se apresentou para cumprir a menagem, mas que foi constrangido porque teve de ficar esperando do lado de fora do Batalhão. E conta que, por isso, tomou a decisão de voltar para a casa da irmã, cujo endereço o PM garante que constava do processo.
A prisão foi revogada três dias depois pelo juiz da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, Benjamim Acácio de Moura e Costa. O magistrado considerou que o réu é primário e que não há “indícios robustos” de autoria do crime apontado no processo. A prisão, nas palavras de Costa, representou grave violação aos direitos e garantias fundamentais, especialmente a dignidade da pessoa humana e ao próprio Estado Democrático de Direito.
Para buscar Helbel na casa da irmã, a PM mobilizou até mesmo o Batalhão de Choque. Veja nas fotos a quantidade de policiais mobilizados no dia da prisão.
Antes de ser levado ao Batalhão de Polícia da Guarda (BPGd), em Piraquara, ele foi levado á sede do Batalhão, em Maringá. E afirma ter se sentido forçado a assinar um processo de deserção aberto contra ele pela corporação. “Eu assinei porque não estava em condições devido a tanta pressão.”
A baixa de Helbel foi revertida no dia 29 de outubro, uma vez que o processo de deserção foi realizado, mesmo ele estando afastado por força de atestado do psiquiatra.
O BPGd é um local exclusivo para a prisão de militares. “Fui colocado num cubículo. Mesmo sendo preso preventivo e ter nível superior, fiquei preso em cela comum juntamente com outros presos, inclusive já condenados.”
Helbel afirma que foi alvo de tantos procedimentos abertos pela PM que seria impossível estar presente em todas as audiências ou constituir advogados para essas ocasiões, o que resultou em mais penalizações contra ele.
Policial denuncia procedimentos forjados
Segundo o PM Ricardo Helbel, o Regulamento Interno e dos Serviços Gerais da Polícia Militar do Estado do Paraná (RISG/PMPR), decreto estadual 7.339, determina que as escalas de trabalho dos policiais sejam formalizadas e arquivadas. Mas o Comando de Maringá convocava o efetivo para o trabalho por meio do WhatsApp, de última hora. E as mudanças de horário eram comuns.
Em procedimento aberto por ele, a PM teria forjado escalas, recolhendo assinaturas de oficiais para anexar ao processo.
O Poolicial também apresentou requerimento à corporação reclamando do fato de que as munições fornecidas aos policiais têm de ser usadas em, no máximo, seis meses após a abertura dos lotes.
Nesse processo, o Batalhão foi obrigado a fazer um levantamento que comprovou a utilização de munições com prazo de validade vencido. “A gente utiliza munições que não pode garantir sua eficácia”, afirma.
O policial alega que, após os questionamentos, a PM começou a abrir procedimentos contra ele, alegando principalmente faltas no trabalho. Mas todas essas faltas, garante Helbel, foram justificadas com atestados médicos.
Em uma ocasião, o policial diz que teve dengue e não conseguiu se deslocar de sua cidade até Maringá para entregar o atestado na data correta. Um dos processos aos quais ele responde foi em virtude desse caso. Esse processo também teria sido forjado, uma vez que a escrivã não participou das audiências, mas teve sua assinatura apresentada nos autos.
Outra forma de perseguição, de acordo com ele, teriam sido transferências forçadas, entre elas para a Penitenciária de Maringá, onde o policial teve de enfrentar uma rebelião e passou a ter problemas emocionais, tendo de se tratar com psiquiatra.
Helbel reivindica mais qualidade de vida aos profissionais de segurança pública para que possam prestar melhores serviços à sociedade. “Quando o policial vai para a rua com uma carga de estresse muito alta isso acaba refletindo em quem não deve.”
A Rede Lume pediu entrevista ou posicionamento da PM sobre o caso e aguarda manifestação da assessoria de imprensa da instituição, em Curitiba.
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