Hospitais precisaram providenciar câmaras frigoríficas para armazenamento de corpos; solidariedade começa a amenizar crise da falta de exigênio
George Dantas, de Manaus, especial para a Lume
Foto em destaque: Raphael Alves/Amazônia Real
Nos últimos dias, o Amazonas virou a principal manchete dos noticiários nacionais, com a segunda onda da Covid-19 atingindo o estado em cheio e, por conta disso, a saúde de Manaus, sua capital – e posteriormente dos municípios do interior – entraram em colapso, com pacientes indo a óbito pela falta de atendimento básico.
Nos três maiores hospitais da capital, referência no combate ao novo coronavírus, o cenário é de guerra. Com a falta de leitos no Hospital Delphina Aziz, no Hospital Platão Araújo e no Hospital 28 de Agosto, a aglomeração de familiares e pacientes contaminados na área externa virou característica, enquanto aguardam atendimento ou transferência.
Os três hospitais, somados, fornecem aproximadamente de 800 leitos para a capital amazonense, que tem população superior a dois milhões de habitantes. Com a explosão de casos na segunda onda, os líderes estaduais e municipais se uniram, com o Hospital Nilton Lins e o Hospital Universitário Getúlio Vargas sendo convertidos em hospitais de campanha e fornecendo mais 140 leitos para Manaus.
Além disso, tendas foram instaladas nas áreas externas dos hospitais, com médicos realizando a triagem inicial dos pacientes, buscando evitar uma aglomeração ainda maior dentro das unidades de saúde. A medida ajuda, mas não resolve. Durante visita a unidades de saúde, pessoas mortas em frente a unidade que buscavam atendimento foram notadas.
Corpos empilhados dentro de salas do hospital aguardando a remoção por parte do Instituto Médico Legal (IML) também foram vistos.
Câmaras frigoríficas foram instaladas nas áreas externas dos hospitais. A medida foi necessária pois o IML não conseguia suprir a demanda de remoção de corpos dos hospitais, com as câmaras fazendo a preservação do corpo até a retirada. Essa atitude também foi tomada na primeira onda da Covid-19 na Capital, ainda em maio de 2020.
Os cemitérios da capital também ficaram sobrecarregados, com filas de veículos se formando em frente, por conta do número elevado de sepultamentos. Para tentar driblar a falta de covas, o prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), propôs a construção de 22 mil sepulturas verticais, que ocupariam menos espaço e permitiriam mais enterros.
Assista depoimento de George Dantas em vídeo abaixo:
As Unidades Básicas de Saúde também são parte importante no combate ao coronavírus, ainda que sejam deficitárias. Das mais de 100 UBS da capital, apenas 18 fazem a triagem inicial da Covid-19, com a maioria das pessoas com suspeita procurando diretamente os hospitais, causando a superlotação. Ao todo, as UBS atendem cerca de 200 pessoas por dia.
Além da falta de leitos, a crise do oxigênio também atingiu a capital amazonense, por conta da alta alarmante de casos. Do total, Manaus tem a necessidade diária de 70 mil metros cúbicos de oxigênio, com o fornecedor da capital conseguindo produzir apenas 28 mil metros cúbicos, ocasionando na falta deste item tão importante.
Por conta da falta de oxigênio nos últimos dois dias, Manaus viveu dias de terror. Ao todo, foram quase 400 sepultamentos, a maioria de pessoas sufocadas pela falta de oxigênio, com o clamor do povo amazonense chamando a atenção nacional.
Nos hospitais, o cenário desolador transformou a situação em uma verdadeira corrida pela vida, com os familiares procurando oxigênio em empresas privadas e pagando custos elevados por isso. A situação ficou tão alarmante que empresas foram notificadas judicialmente para entregarem seu oxigênio disponível, além de pessoas tendo seus cilindros apreendidos pela Polícia Militar e destinados a hospitais da capital.
Em dezembro um cilindro com 50 litros de oxigênio em Manaus custava R$ 500; hoje, custa R$ 2.400. Sem a pandemia, 50 litros saiam por menos de R$ 100
A situação também é alarmante no interior. Manacapuru, Itacoatiara e Coari também já anunciaram a falta de oxigênio em seus municípios, com o prefeito deste último alegando que tiveram seus cilindros desviados pelo governador do Amazonas, Wilson Lima.
Em Parintins, que também viveu o caos do oxigênio, o prefeito da cidade – Bi Garcia, fechou parceria com uma empresa alemã, para que os cilindros fossem fornecidos à cidade.
O caso ficou tão grave que uma intervenção federal começou a ocorrer no Estado. Com isso, pacientes serão transportados de Manaus para as cidades de São Luís, Teresina, João Pessoa, Natal, Goiânia, Fortaleza, Recife e o Distrito Federal, que totalizaram 149 leitos disponíveis para Manaus. Alguns pacientes recusam, pois o custo será bancado apenas para quem estiver doente, com o familiar tendo que usar de recursos próprios para acompanhá-lo.
Bebês prematuros em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) também sofreram com a falta de oxigênio e causaram comoção nacional, com São Paulo, Paraná e Minas Gerais oferecendo seus leitos para receber os recém-nascidos. Posteriormente, a medida voltou a ser analisada pelo alto risco para as crianças que o translado envolveria.
Na última sexta-feira (15), o Amazonas teve 3.151 novos casos de Covid-19, totalizando 226.511 em todo o estado, desde o começo da pandemia, de acordo com dados da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS).
Com toda essa crise, nos últimos dois dias (14 e 15), Manaus totalizou 399 sepultamentos, com 200 destes confirmados como Covid-19. A situação merece ser analisada, pois Manaus tem média diária de 30 óbitos, com uma subnotificação de casos de Covid-19 sendo a principal suspeita dessa subida não explicada. Ao todo, o Amazonas já contabiliza 6.043 óbitos por conta do novo coronavírus.
CAUSAS
Manaus hoje supera o número de casos da primeira onda, quando o ápice de mortes em um único dia chegou a 85. Além disso, o máximo de novos casos em um único dia, na época, foi de 140 novos contaminados com o vírus.
Um relaxamento excessivo da população é a principal justificativa para o aumento de casos, com as medidas de prevenção sendo ignoradas e festas, confraternizações, dentre outros, tendo virado rotina no dia dos Manauaras.
Quando Manaus começou a observar a alta de casos, ainda em dezembro, Wilson Lima tentou lançar um pacote de medidas restritivas mais firmes, similar a um lockdown, mas voltou atrás pela forte pressão que sofreu dos comerciantes.
Agora, para tentar conter o avanço, ele instituiu um toque de recolher na capital, das 19h até às 6h, sendo permitida a circulação nas vias apenas para áreas essenciais, como segurança, saúde e imprensa. No primeiro dia do toque de recolher (15), alguns motoristas de aplicativos foram detidos durante entregas, por não estarem respeitando a medida.
Em ação levantada por um vereador amazonense, o ENEM foi adiado no estado. A prova seria realizada nos próximos 17 e 23 de janeiro mas, com a alta de casos, a prova deverá ser reagendada para 23 e 24 de fevereiro. O INEP não descarta excluir o Amazonas do seu exame anual.
Ao todo, foram destinados pelo Governo Federal ao Amazonas r$ 8,91 bilhões para o combate da Covid-10, com R$ 25 milhões tendo sido repassados em 31 de dezembro como medida auxiliar para o primeiro mês de 2021, com o dinheiro não tendo sido efetivamente visto pela população.
O colapso que vive a saúde de Manaus virou notícia internacional, com famosos unindo forças para buscar uma solução para o estado, arrecadando verbas para a compras de cilindros de oxigênio para o estado. A mobilização começou com o ator e influencer Whindersson Nunes, que se comprometeu a destinar 10 cilindros de 50L para o estado. A movimentação surtiu efeito, com famosos como Simone (da dupla Simone e Simaria), Wesley Safadão, Richarlison (jogador da seleção Brasileira), o escritor Paulo Coelho, a cantora Marilia Mendonça, a artista Tata Werneck, dentre outros, mobilizando suas forças para o Amazonas.
De acordo com Whindersson Nunes, o dinheiro arrecadado, atualmente em R$ 340.817,80 – será destinado a empresas que forneçam o serviço, para que as mesmas forneçam os cilindros aos hospitais.
O cantor Gusttavo Lima garantiu a logística dos cilindros para a capital amazonense, solucionando um dos maiores problemas atualmente, com o translado necessário dos estados vizinhos para o Amazonas.
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