Imunização de grupos prioritários já começou, mas plano nacional não detalha oferta para restante da população
Bruno Leão
Cecília França
Desde de que o Ministério da Saúde divulgou o Plano Nacional de Imunização contra a covid-19, em 16 de dezembro, houve vários questionamentos, sendo um deles quanto à abrangência da vacinação. O plano elenca diversos públicos prioritários, somando cerca de 54 milhões de brasileiros, mas resta a dúvida sobre uma vacinação universal pelo Sistema Único de Saúde (SUS), defendida por entidades e movimentos sociais.
Na Medida Provisória n.1.026, editada pelo governo federal em 6 de janeiro de 2021 para facilitar a compra de insumos, há citação a empresas particulares como possíveis partes do plano nacional: “Art. 15. Os estabelecimentos de saúde, públicos e privados, deverão registrar diariamente e de forma individualizada os dados referentes a aplicação das vacinas contra a covid-19 e de eventuais eventos adversos em sistema de informação disponibilizado pelo Ministério da Saúde.“, diz o texto.
Questionado sobre a participação das clínicas no plano, o Ministério da Saúde não foi taxativo: “Na eventualidade da integração de clínicas particulares de vacinação ao Plano Nacional, é preciso observar que o registro da aplicação do imunizante precisaria ser feito junto à Rede Nacional de Dados de Saúde e à caderneta digital de vacinação.”, respondeu à Lume. A Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC) negocia, há algumas semanas, a compra de doses de uma vacina produzida na Índia.
A Rede Nacional de Médicos e Médicas Populares (RNMP) defende a vacinação pelo SUS como um direitos de todos e uma responsabilidade do Estado. A médica e militante Flora Passini acredita que a imunização em massa deve acontecer, embora ainda sem previsão. Ela lembra que vacinação é uma estratégia coletiva e que para atingir este objetivo é necessário que o acesso seja universal.
“Todos devem se vacinar, em todos os locais do planeta, para acabar com a pandemia. Precisamos interromper a transmissão do vírus, impedindo que pessoas adoeçam. Precisamos interromper a multiplicação do vírus, para evitar que sofra mutações graves, com o passar dos meses, e que haja risco de adquirir resistência contra as vacinas já estudadas”, alerta.
Para Flora, o Brasil, por motivos ideológicos e políticos, perdeu a chance de ser modelo na vacinação contra o novo coronavírus. Ela se refere ao sucesso do Plano Nacional de Imunizações, lançado no país na década de 1970, por meio do qual são ofertadas cerca de 20 vacinas aos brasileiros ao longo da vida. Seu sucesso é modelo para o mundo.
“O PNI foi um dos contribuintes para que a mortalidade infantil caísse muito e para que a expectativa de vida subisse entre a população. Conquistas imensuráveis. Não existe mais enfermaria nos hospitais para sarampo, difteria, poliomielite, varicela. Foram exemplos de doenças controladas com vacinas que, graças ao SUS e ao PNI, chegaram de Norte a Sul, da zona rural a zona urbana, aos rincões do país”, ressalta Flora.

A vacina contra a covid-19 tem a mesma importância que essas outras tiveram no passado. A médica destaca, no entanto, que os efeitos de uma vacinação não são imediatos. “Ainda temos um longo percurso até que uma parcela considerável da população esteja protegida. Segundo a OMS, os resultados mais profundos devem demorar pelo menos seis meses (após o início da vacinação) para aparecer”, conclui.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Norte do Paraná (Sindijor Norte/PR) também lançou a campanha “Vacina para Todos” antes mesmo da aprovação do uso emergencial da Coronavac e da vacina Oxford/AztraZeneca, no último domingo. Vale ressaltar que o uso emergencial autoriza a imunização apenas dos grupos de risco.
Para o dirigente do Sindijor José Maschio, “Vivemos um processo de higienização social patrocinado pelo governo de morte do fascismo no poder. É preciso que entidades, associações e sindicatos de trabalhadores se unam na campanha Vacina para Todos”.
Em texto publicado no site da entidade, Maschio classifica como “desesperadora” a situação enfrentada pelo país na pandemia, agravada pela “inércia, proposital, do governo federal” em comprar a vacina. Mais de 40 países iniciaram a vacinação antes do Brasil.
Desde o início da pandemia, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tem se posicionado em defesa do SUS, da ciência e da vacina universal e urgente para todo o povo brasileiro. A coordenadora estadual do movimento, Ceres Hadich, defende que esta pauta esteja alinhada com outras.
“Desde a aprovação da licença (para uso emergencial) estamos reafirmando essa posição, bem como a leitura de que essa questão é política e precisamos articular essas pautas à pauta do ‘Fora Bolsonaro’, como necessárias e urgentes”, finaliza.
O Ministério da Saúde garantiu fornecer aos Estados 8 milhões de doses de vacina em janeiro, 30 milhões em fevereiro, outros 30 milhões em março e 40 milhões em abril. O envio das primeiras remessas começou hoje.
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