Por Cecília França

Dentro de um barril tinha um menino acorrentado.

Um menino esquálido, acorrentado, dentro de um barril.

O barril que um dia guardou tinta, ali guardava fezes e urina do menino acorrentado.

Um menino. Acorrentado.

E o país, assombrado?

E o presidente, indignado?

Como é possível viver se havia um menino acorrentado?

Ele não comia, não bebia, sequer sentava. E a gente, onde estava?

Havia uma meia-irmã na casa.

Havia uma pessoa capaz de conviver com um menino acorrentado.

“Não tenho nada com isso”, disse ela.

Ela sabia do menino acorrentado. E não tinha nada com isso, pensava.

O menino agora recupera o corpo. E a mente?

Poderá o menino acorrentado viver livremente?

Quebrar as correntes do trauma de ser torturado?

O menino dentro de um barril. Acorrentado.

E a gente continua a andar.

O menino dentro de um barril

E a humanidade se esvaindo feito fogo em um pavio.

*Cecília França é jornalista.

Deixe uma resposta

%d