Profissionais do sistema de socioeducação buscam levantar questões raciais e de gênero que levem à quebra de preconceitos por parte dos adolescentes
Cecília França
Foto em destaque: Divulgação
Ainda em 2020, a juíza Cláudia Catafesta, da vara de adolescentes em conflito com a lei de Londrina, levou para a biblioteca do Centro de Socioeducação 2 (Cense 2) dois exemplares do livro “Eu sou Malala”, que relata a história da jovem paquistanesa que enfrentou o Talibã pelo direito das meninas à educação. Nesta tarde os adolescentes debatem o livro com a presença de uma jovem advogada muçulmana a fim de compreender a realidade dessas mulheres e – por que não? – aprender com ela. O encontro vai reunir adolescentes de outros Censes do Estado.
Malala Yousafzai foi baleada pelo Talibã em 2012 quando retornava da escola. O grupo fundamentalista islâmico se difundiu por décadas no Paquistão e, especialmente, no Afeganistão. Malala então se tornou uma voz mundial em defesa da educação de meninas e jovens, sendo a pessoa mais nova a receber um prêmio Nobel da Paz. A advogada Bahar Ramazanova, natural do Azerbaijão, convidada do Clube do Leitura, explica à Lume importância da ativista (leia entrevista completa abaixo):
“Este livro é muito útil para compreender a história e correlacionar os eventos para uns aos outros. Acima de tudo, ela mostra como ela foi criada de forma diferente, como ela era diferente e como ela salvou muitas meninas e como ela é um modelo para muitas de nós”.
Para a juíza Cláudia Catafesta, a leitura do livro é uma oportunidade de se discutir questões de gênero com os adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. “A história da Malala é pouca conhecida pelos adolescentes e acho que ela combina a bravura da juventude, a coragem, e também a questão do feminino. Pelo menos dentro do ambiente socioeducativo há muitas questões a serem enfrentadas sobre o papel da mulher, preconceito mesmo masculino que os adolescentes têm”, afirma.
A professora de Língua Portuguesa do Cense 2, Angelita Martins Siqueira, conta que questões femininas e raciais têm sido levantadas por meio dos títulos escolhidos para o Clube de Leitura. A ideia de debater “Eu Sou Malala” surgiu quando os adolescentes foram apresentados ao “Pequeno Manual Antirracista”, escrito por Djamila Ribeiro.
“No nosso clube é assim, todos podem sugerir obras interessantes. Mas a temática feminina nos interessa muito por conta da cultura dos nossos meninos, de como veem as mulheres que cercam suas vidas. Nós semeamos bons exemplos”, declara. No final de 2020, como “um esquenta” para Malala, o clube promoveu a discussão do conto “O que mais desejam as mulheres”, com a participação da contadora de histórias Letícia Chiocheta.
“Todos os nossos encontros sempre trazem convidados. A ideia da participação da Bahar é coisa de professora mesmo. Sempre gosto de mexer com as estruturas para impactar mais nossos meninos”, diz Angelita. “Na aula que dei agora à tarde (ontem) um dos alunos comentou que Malala nasceu 67 anos depois de Anne Frank. Fiquei super emocionada em ver a relação que ele fez entre essas duas jovens”.
A professora diz que a equipe não pensa muito em resultados quando planeja os encontros do clube. “Nossa ideia é sair semeando coisa boa. Agora, se elas germinarão, aí já é outra história porque o processo de formar bons leitores depende de muita coisa”, afirma. Pelo visto, os frutos já começaram a aparecer.
O encontro de hoje do Clube de Leitura acontece às 14h de forma virtual.
Confira entrevista completa com Bahar Ramazanova:
Como é a vida de uma jovem muçulmana? Vocês enfrentam muitas restrições?
Não existe o mesmo nível de restrições que as mulheres muçulmanas costumavam ter nos séculos passados. Hoje em dia, as mulheres nas sociedades muçulmanas aumentaram seu nível de educação, o que lhes permite entender muitas coisas que acontecem ao seu redor. Mas com certeza, isso ainda existe para aquelas que são privadas de educação adequada. Todas as meninas muçulmanas, como outras, obedecem às leis nacionais criadas para toda a população. Ser muçulmana faz parte da sua fé, mas é você quem decide como viver a sua vida. Se você não conhece seus direitos e obrigações, dificilmente reivindicará coisas a seu favor. Reconhecendo o papel da educação, sua influência em toda a sua vida, nas suas decisões realmente faz um grande sentido. Isso ajuda uma garota a viver a vida que ela deseja construir, mais especificamente como
construir e aumenta sua possibilidade de controlar seu destino.
O que a história da Malala representa para você? Por que o livro “Eu Sou Malala” é importante?
Neste livro, Malala ajuda o mundo a desvendar os pensamentos controversos sobre a religião e a população muçulmana. Este livro é muito útil para compreender a história e correlacionar os eventos para uns aos outros. Acima de tudo, ela mostra como ela foi criada de forma diferente, como ela era diferente, como ela salvou muitas meninas e como ela é um modelo para muitas de nós.
Qual a sua expectativa sobre a participação no Clube da Leitura do Cense?
Eu gostaria de ser capaz de esclarecer as dúvidas sobre o assunto e de dar uma esperança no futuro real e positiva para os participantes.
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