Por Carlos Monteiro*
Sem mais delongas, continuamos com as explicações de Luís da Câmara Cascudo, o homem que estampou a nota de cinquenta mil cruzeiros ou, como era conhecido em Natal, “o homem que sabe tudo” – reconhecido merecidamente -, acerca das expressões que ouvimos diariamente, mas, na maioria das vezes, não temos noção de como se formaram ou por que parecem sem sentido dentro da lógica óbvia.
Esse teu olhar… por que “comemos com os olhos” e não com a boca, com as mãos quando desejamos algo, normalmente aquém da nossa possibilidade? Essa vem da soberania da África Ocidental. Não era consentido por eles que súditos acompanhassem suas refeições. Era permitido apenas que olhassem, sem participar de forma ativa gastronomicamente. Já na Roma antiga, cerimônias fúnebres de cunho religioso, ofertavam um lauto banquete aos deuses. Não era permitido que se tocasse na oferenda, apenas que a olhassem, então “comiam com os olhos”.
A cegueira da visão. “O pior cego é o que não quer ver”, mas por que um cego não quereria ver? O primeiro transplante de córnea relatado nos anais da medicina data de 1647. Realizado pelo Dr. Vicent de Paul D`Argent na Universidade de Nimes, na França. Imaginemos, alguém voltar a enxergar há exatos 374 anos. Um milagre da medicina. Todos muito felizes com o sucesso da cirurgia, menos Angel, o paciente pois, assim que passou a enxergar, ficou horrorizado com o mundo que via, muito diferente daquele que idealizara em seus sonhos e devaneios; um mundo extremamente melhor daquele que enxergava agora. Não conformado com a situação, pediu ao cirurgião que arrancasse seus olhos.
O caso acabou chegando aos tribunais de Paris e ao Vaticano. A causa foi ganha por Angel, o cego que não quis ver.
Quem tem “olhos de lince” enxerga mais longe, isso é fato, também não se tem notícia de ter se avistado algum exemplar deste mamífero da família dos Felidaes fazendo uso de óculos, logo tem uma visão apuradíssima, enxerga seis vezes mais que os seres humanos. Tudo claro então, essa foi fácil. Nãnãninãnão essa expressão nada tem a ver com o felino de pelos nas pontas das orelhas. Sua origem está relacionada a mitologia grega. A expressão correta é “olhos de Linceu”, mais uma vez, com o transcorrer do tempo, foi sendo modificada pela “voz do povo” por se tratar de um parônimo.
Reza a lenda que Linceu, piloto do navio Argo, da expedição dos “Argonautas” – grupo de 56 heróis da mitologia grega -, partiram em busca do “Tosão de Ouro” – a lã de ouro do carneiro alado Crisómalo. Linceu tinha uma visão tão fantástica que enxergava através de paredes de pedra, conseguia ver o que acontecia no céu e no inferno e contar o número de barcos de uma frota de guerra há mais de 200 quilômetros. Logo, quem tinha uma visão excepcional, tinha “olhos de Linceu”.
Ando “queimando as pestanas” para descobrir a origem e o significado de todas as expressões. Mas, o que isso quer dizer? De onde vem essa possibilidade de, ao estudarmos, sairmos com os cílios chamuscados? Antes de Benjamin Franklin e Thomas Alva Edison trazerem seus inventos maravilhosos ao planeta, eram necessárias velas ou lamparinas para se estudar à noite. Ambas emitem luminosidade baixa o que obrigava aos estudantes aproximá-las tanto do cartapácio quanto das pestanas. Num momento de descuido as ditas cujas saiam chamuscadas. Bons estudantes à época “queimavam as pestanas”, hoje queimam incensos…
De uma discussão acalorada entre um oftalmologista e um odontólogo terá saído esta expressão: “olho por olho, dente por dente”? Nesse caso é óbvio que não. Se trata do “Código de Hamurabi”, conjunto de leis criadas pelo rei com o mesmo nome, no século XVIII a.C., na Mesopotâmia, fundamentado na Lei de Talião. A lei prevê penas, ao réu, com mesmo teor que o crime por ele praticado. Se baseia no “olho por olho, dente por dente” ou seja; tudo igual para ambas as partes. Uma delas determinava: “se alguém enganar a outrem, difamando esta pessoa, e este outrem não puder provar, então aquele que enganou deverá ser condenado à morte”. Hoje em dia ia faltar verdugo. Por outro lado, tinha cunho justo, já que não havia seguros para as safras…: “se alguém tiver um débito de empréstimo e uma tempestade prostrar os grãos ou a colheita for ruim, ou os grãos não crescerem por falta d’água, naquele ano a pessoa não precisa dar ao seu credor dinheiro algum. Ele deve lavar sua tábua de débito na água e não pagar aluguel naquele ano”.
Hamurabi “não deixava barato”…
(continua amanhã)
*Carlos Monteiro, 61, é cronista, jornalista, fotógrafo e publicitário carioca. Flamenguista e portolense roxo, mas, acima de tudo, um apaixonado pela Cidade Maravilhosa.
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