Por Antonio Rodriguez*
Completamos 521 anos ontem
Não sei se comemoramos
Não existem motivos sinceros
Nada real para ser comemorado.
Mas vocês ainda são brancos.
Se vocês não podem comemorar
Eu sequer consigo existir
Sobreviver diariamente
Sem temer a minha morte
E isso não tem a ver com pandemias.
Genocídio já não é uma pandemia
Nem uma epidemia
Sequer o apocalipse
É a nossa rotina.
Ver tantos corpos negros
Preenchendo mais covas do que existem
E os jornais sequer nos expõem
Nem sequer em notas de rodapé
Se dignam a escrever nossos nomes.
Com síndrome de vira-latas
Nos vimos tão felizes em comemorar a condenação
De um porco que já devia estar morto.
Parece tão importante
Tão relevante ver apodrecer
Detrás das grades que tantos de nós
Que foram injustamente condenados
Apodreceram também.
Mas se lembrar
Que apenas 1 hora antes de lágrimas de alegria rolarem
Muitas mais lágrimas de tristeza caíram
Mancharam o solo da nossa mãe Terra
Como ácido caindo de nossos olhos
Completamente fermentados de ódio.
E uma semana
E um mês antes
E um ano antes
E uma década antes
E um século antes
E meio milênio antes.
Porque nós choramos há 500 anos.
E depois de 521 anos de história
Nós ainda estamos dando os primeiros passos
Aqui, nos EUA e por todo o globo
Os brancos ainda estão dando os primeiros passos.
E eu antes de dar meus primeiros passos
Já carregava o RG no bolso
Já sabia responder a polícia
E já tinha noção da violência que permearia minha vida.
Antes dos primeiros passos.
A branquitude dá os primeiros passos ainda, e por isso eu tive que aprender
desde cedo que eu não ia poder dar os meus passos.
São tantos primeiros passos que se acostumaram a pisar em corpos e não
escorregar em tanto sangue que eles já derramaram.
Sangue que mancha mãos e gerações, mas vocês juram que não é culpa sua,
mesmo eu sabendo que enquanto eu escrevia essa coluna e você estava
lendo, mais dois corpos pretos preencheram covas e nós nem sequer
saberemos seus nomes.
*Antonio Rodríguez,18, estudante e poeta nas horas vagas (e algumas ocupadas também). Apaixonado pela vida, faz o máximo para transformar tudo em poesia. Mantém o Instagram @a.poetizando.me
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