Atuando na acusação de crimes contra mulheres ou cometidos por policiais, a advogada londrinense Nayara Vieira vê no direito a ferramenta para criar uma sociedade mais justa

Por Mariana Guerin*

“Adolescente, eu era muito encrenqueira, gostava de resolver o problema alheio. Talvez aí já me via meio advogada.” Revisitando sua juventude, a londrinense Nayara Larissa de Andrade Vieira, 28 anos, define como se deu sua escolha profissional. Atendendo clientes em penitenciárias e cadeias e assistindo na acusação de crimes contra mulheres, a advogada representa o frescor que as causas humanitárias precisam para driblar o sistema.

Nayara em um de seus julgamentos. Fotos: arquivo pessoal

Criada pela avó até aos 12 anos, Nayara conta que viveu uma infância sem luxo. “Sempre estudei em colégio público. Gostava muito de estudar, inclusive. Era uma das melhores alunas até a oitava série”, recorda a advogada, que inspirou a irmã Sumaya a seguir seus passos na advocacia. “Tenho apenas uma irmã, que faz direito também, e, atualmente, é uma das minhas estagiárias”, conta.

A morte da avó em decorrência de um câncer no fígado mudou a vida de Nayara para sempre. Aos 12 anos ela se viu morando com a mãe depois de muitos anos. “Apesar de ter me criado superprotegida, minha avó me ensinou que uma hora eu precisaria me defender sozinha. Tenho certeza que foi graças a ela que hoje eu não tenho muito medo das novidades e peças que a vida prega”, avalia a jovem, que passou muito tempo da adolescência dentro de casa porque a mãe “sempre foi muito rígida”.

Ela garante que conquistou seu maior sonho de vida que era se formar numa universidade. “Meu maior sonho realizado é ser advogada. Porque não tinha grana para fazer faculdade particular e foi minha tia, que é empregada doméstica na Alemanha, quem pagou o curso para mim. Realizei meu sonho e o dela”, conta Nayara, que confessa ter outros sonhos mais capitalistas como “ir morar em Balneário Camboriú, comprar uma casa, viajar bastante pelo mundo”.

Ela relembra os primórdios na profissão, quando começou advogando no caso de um amigo de infância. “Lamento muito ele não ter tido a mesma oportunidade que eu tive. Ele foi para o crime. Sou grata às portas que o caso dele me abriu. Ele me indicou para muita gente que acabou por me contratar porque viu o tanto que me dediquei”, avalia Nayara.

Segundo ela, seu nome é reconhecido entre os advogados da cidade por atuar em crimes cometidos por militares como assistente de acusação da vítima. “Não suporto ver o que fazem por ter poder. Me inspira a advocacia artesanal, na qual o advogado tem empatia pelo cliente. Se coloca, de fato, no lugar daquele que está encarcerado, do seu familiar que está ali sofrendo. Não vai tão somente pelo cifrão. Dinheiro é bom, mas ser reconhecida porque tocou uma alma é melhor ainda”, declara a advogada, reforçando que essa é a mensagem que ela tenta ensinar diariamente aos seus estagiários: “Vejo que consigo. Eles são muito humanos.”

Sua rotina atual é basicamente atendimentos a clientes em penitenciárias e cadeias, bem como situações emergenciais em flagrante delito, “que é quando a pessoa acabou de ser presa cometendo crime”, explica. “Atuo muito na defesa do acusado/indiciado, mas também faço assistência de acusação em crimes contra mulheres e crimes cometidos por policiais”, completa.

“Por ter vindo de classe média baixa, sei bem as dificuldades que as causas sociais enfrentam. A falta de empatia das pessoas, as discriminações, o preconceito. Então eu luto muito por causas de pessoas encarceradas. O Estado prevê o mínimo, mas não dá o mínimo. Enquanto eu tiver forças, continuarei lutando”, opina a advogada.

Ela mantém projetos de arrecadação de alimentos e produtos de higiene pessoal que fazem toda a diferença ao público atendido pelo seu escritório. “Sem contar que é gratificante demais ajudar o próximo. Se eu pudesse ajudaria muito mais! Vejo que os que se aproximam de mim por conta dos projetos normalmente saem tocados e pensando em como passar isso para frente.”

“Como minha rotina é muito estressante em razão do trabalho, quando tenho um tempo vago, gosto de ficar em casa, cozinhar, viajar para praia. Inclusive se pudesse moraria no litoral de Santa Catarina. Amo praia”, comenta Nayara, que tem como meta de vida “fazer a sociedade entender o verdadeiro conceito de empatia e humildade”.

“O advogado é fundamental na realização da justiça e já me sinto muito honrada em carregar o título de advogada. A educação com certeza é o caminho para uma sociedade mais justa. Eu poderia ter ido para outro lado se eu não tivesse estudado, ou se não tivesse tido a oportunidade e apoio da minha tia. Muitas meninas da minha idade e que estudaram comigo precisaram se prostituir, por exemplo, para conseguir o básico da sobrevivência”, diz.

Para ela, a inspiração em seguir vem do autoconhecimento: “Eu me descreveria como uma mulher forte e capaz, feliz do meu jeito. E dos meus sonhos eu corro atrás”.

*Mariana Guerin é jornalista e confeiteira em Londrina. Adoça a vida com quitutes e palavras.

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