Olá! Sou a Ana Maria Alcantara, mas pode me chamar só de Ana. Estou chegando para integrar o time de colunistas aqui da Rede Lume de Jornalistas e venho para conversar um pouquinho sobre espaços de existência e de resistência.
Essa coluna é um clamor por empatia e um convite para pensarmos um processo de conscientização coletiva, um espaço para diálogos de enfrentamento de problemas estruturais da nossa dinâmica social.
Sou uma mulher hetero cisgênero preta. Falo a partir de um lugar à margem, que me coloca na base da hierarquia social. Aqui da zona periférica, opressões relacionadas à raça, classe e gênero atravessam diariamente a minha existência enquanto corpo feminino preto.
Numa construção social em que mulheres sequer têm a posse de seus próprios corpos, nós, mulheres pretas, temos ainda menos controle sobre nós mesmas. Somos o grupo mais exposto a trabalhos subalternos, mais exposto às violências sexuais, temos menos acesso a serviços, recebemos salários menores, somos o grupo com menor escolaridade, somos a base da pirâmide social, as últimas na fila do pão e, não raro, nossa vez nunca chega.
Mas daqui do periférico o ângulo de visão daquilo que é tido como universal e central é diferente. Nosso ângulo de visão é maior, mais amplo e mais abrangente. E por isso que tomamos posse da nossa voz marginalizada e excluída das grandes rodas sociais e intelectuais para compartilhar os nossos próprios saberes, percepções e realidades. Para falarmos e descrevermos nós mesmas com a nossa fala e com a nossa voz. E com isso trazemos possibilidades de vivências e não apenas de sobrevivências para corpos pretos, sejam eles femininos ou não.
E é deste lugar social, afastado da centralidade, que vem o convite para uma troca empática, para um diálogo necessário para se pensar por que mulheres pretas são um dos grupos mais oprimidos da nossa sociedade. Será que somos pessoas “naturalmente” pré-dispostas a esta condição ou fomos confinadas a este lugar à margem, por meio de um sistema patriarcal, racista, machista e heteronormativo?
Digo seguramente que há outras maneiras de ser, saber e existir que não apenas estas propostas pelos mesmos sempre donos dos saberes. Não há porque tudo girar em torno de um suposto ser universal branco, europeu, heteronormativo e masculino, porque estamos no Brasil, onde a democracia racial é um mito, mas a diversidade é real.
E ainda que se coloque no mais alto cargo do executivo uma réplica patética deste padrão eurocêntrico, a realidade no dia a dia já mostrou aonde isso tem nos levado.
Por isso, às pessoas sérias, de todas as partes da esfera social e a todos aqueles em quem ainda há humanidade, meu convite é para um diálogo, onde a vez de falar e ser ouvida é a nossa. E o que estamos dizendo é que questionar os privilégios de quem está no centro, por mais incômodo que seja, é uma necessidade.
Assim como questionar lugares e não lugares é essencial para entender de onde vem essa desigualdade de tratamentos que torna a vida de pessoas pretas tão vulnerável e a nossa dor tão banal.
Existimos como seres dotadas de subjetividades. Somos pessoas. Nossos corpos existem. Nossa subjetividade existe. E nossa força ancestral e nossos saberes nos fizeram resistir até aqui e embora colocadas à margem, daqui propomos diálogos para aqueles abertos às trocas construtivas.
Vamos conversar?
* Ana Maria Alcantara é mulher preta, mãe, jornalista e feminista negra. Ligada no rolê de skincare nas horas vagas.
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