Docentes da rede municipal de Londrina agora não vão mais se dedicar exclusivamente ao ‘Palavras Andantes’

Nelson Bortolin

Foto ilustrativa: Tomaz Silva/Agência Brasil

A Secretaria de Educação nega, mas professores da rede municipal acreditam que a pasta está desmontando o projeto “Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes”, criado há quase 20 anos. O projeto prevê a existência de bibliotecas/salas de leitura em todas as escolas, com um professor especializado e dedicado exclusivamente à mediação da leitura. Todas as turmas passam pela hora do conto ao menos uma vez por semana, momento em que as crianças também fazem empréstimos de livro.

Em 2008, o Palavras Andantes foi considerado o melhor projeto de leitura do País, recebendo o primeiro lugar do prêmio Vivaleitura do Ministério da Educação.

No ano passado, após o início da pandemia e a suspensão das atividades presenciais nas escolas, a hora do conto foi mantida a distância. Os professores faziam a atividade por meio do software pelo qual as aulas eram transmitidas pela internet. Já neste ano, a contação de história passou a ser gravada pela secretaria e enviada aos alunos.

A expectativa com a volta das aulas presenciais era de que o projeto fosse retomado em seu formato original, mas uma circular divulgada em novembro pelo município serviu como um banho de água fria para os professores.

Em grupos de WhatsApp, docentes passaram a trocar impressões sobre o que acreditam ser o fim do projeto. Também trocam fotos de livros guardados em sacos de plástico. Eles dizem que há bibliotecas sendo fechadas.

“Dá um nó na garganta. Na minha escola, os livros estão dentro daquelas lixeiras enormes, que foram enviadas para as escolas com função de separar lixo pelas cores amarelo, azul e vermelha”, afirma um dos docentes. “A biblioteca virou lixoteca da escola”, relata outro.

Um dos trechos da normativa que preocupam os professores diz que a mediação de leitura “acontecerá com empréstimo de livros e com a contação de histórias na forma presencial, a cada quinzena”. “A contação de história e mediação de leitura não ficará somente sob a responsabilidade deste profissional pois a mesma acontecerá através dos vídeos produzidos pela equipe do Palavras Andantes Virtual onde o R1 (professor regente da turma) ficará responsável para acessar e trabalhar em sala de aula”.

A secretária da Educação, Maria Tereza Paschoal de Moraes, nega que haja um processo de desmonte do projeto de leitura. “Como estratégias alternativas, temos duas possibilidades de hora do conto: uma contação gravada por uma professora que representa o projeto e presta esse serviço para toda a rede, mantendo as características na forma de contação, mas com a adaptação para o modo digital”, afirmou ela à Rede Lume.

A outra possibilidade, de acordo com Maria Tereza, é a “contação organizada por um professor indicado pela unidade para atuar frente ao projeto”. “Desta maneira, numa semana a contação acontece em sala de aula com a contação gravada pelo Projeto Palavras Andantes Virtual e mediado pela professora da turma e, na outra semana, a contação será realizada e mediada pelo professor responsável pelo projeto na unidade”, alega.

A secretária diz que todas as escolas deverão indicar um professor para atuar no projeto, utilizando para isso critérios como “competências, habilidades e formação para realizar o trabalho”. Mas admite: esse professor também poderá auxiliar em outras demandas escolares, inclusive substituindo professores regentes

Uma professora que conversou com a Lume e preferiu o anonimato para evitar “perseguições”, diz: “É aí que mora o perigo. Isso quer dizer que um professor muito dificilmente vai conseguir dar prosseguimento ao projeto na grandiosidade e nos benefícios que traz para os alunos. Está havendo um desmonte velado.”

Para a professora, a Prefeitura está num processo de “enxugamento” do quadro de servidores. E o que vai acontecer é que o docente indicado para o Palavras Andantes vai passar a maior parte de sua carga horária em sala de aula substituindo os professores regentes que faltarem.

Noutras palavras, na opinião da professora, as escolas vão tornar o projeto de mediação de leitura apenas virtual. “Não é a mesma coisa, a mediação da leitura, a hora do conto devem ser presenciais para a interação dos professores com os alunos”.

Bibliotecas fechadas

A secretária da Educação afirma que as fotos que circulam nos grupos de WhatsApp mostrando livros em sacos plásticos foram feitas no início da pandemia. Seria uma forma de proteger as obras que, devido às medidas sanitárias, não podiam ser manuseadas.

Ela admite que 9 das quase 90 escolas municipais vão precisar fechar “provisoriamente” as bibliotecas para atenderem ao aumento do número de alunos. São cerca de mil alunos a mais a cada ano.

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