Dia Internacional da Mulher alerta para a importância de educar a população sobre direitos humanos, promovendo uma cultura de igualdade e respeito, sem discriminação e sem violência

Mariana Guerin

Foto: Bruno Mazzoni

Você provavelmente conhece uma mulher ativista pelos direitos humanos e que faz a diferença na sua comunidade. Se não conhece, essa mulher pode ser você, já parou para pensar nisso?

No início da história brasileira, Dandara organizou, junto ao companheiro Zumbi, o maior quilombo das Américas: Palmares. Ela plantava, caçava e praticava capoeira. Pegou em armas para liderar homens e mulheres a resistirem à escravização no quilombo.

Já a quituteira Luiza Mahim, trazida ao Brasil como escravizada, foi uma das líderes na Revolta dos Malês. Estratégica, ela colocava dentro de seus quitutes informações sobre os próximos passos do movimento para motivar os revoltosos.

Tereza de Benguela ou “Rainha Tereza” foi mais uma líder quilombola, que atuou no Quilombo de Quariterê, no Mato Grosso. Seu quilombo resistiu com cerca de 100 pessoas até Tereza ser capturada e morta por soldados em 1770.

No início do século passado, a jornalista Antonieta de Barros dedicou sua vida a ampliar o acesso dos brasileiros à educação. Com 17 anos, fundou um curso voltado à alfabetização de adultos e anos depois foi diretora do Instituto de Educação, do qual foi exonerada por suas posições políticas.

Ela, então, fundou um jornal para defender suas ideias de liberdade e emancipação das mulheres. Em 1934, Antonieta foi a primeira mulher e a primeira pessoa negra a assumir um mandato político no Brasil, tornando-se deputada estadual.

Na mesma época, Luz del Fuego escandalizou o país com seu movimento pela liberdade de expressão e corpo. Dançarina, ela fundou uma colônia naturalista e era constantemente assediada pelos homens que frequentavam o local. Foi assassinada após denunciar os assédios que sofria.

Carolina Maria de Jesus, moradora de uma favela na Zona Norte de São Paulo, trabalhava como catadora e registrava o cotidiano da comunidade em cadernos que encontrava no lixo. Tornou-se uma das primeiras e mais importantes escritoras negras do País.

A cearense Maria da Penha foi agredida fisicamente pelo marido durante todo seu casamento. Sofreu duas tentativas de homicídio: uma por arma de fogo, que a deixou paraplégica, e outra quando foi eletrocutada durante o banho. Uma lei criada em 2006 para coibir e punir a violência contra as mulheres leva seu nome.

A vereadora carioca Marielle Franco foi eleita com a quinta maior votação da cidade do Rio de Janeiro, em 2016. Além de lutar por direitos para mulheres e população LGBTQIA+, denunciava constantemente abusos de autoridade por parte de policiais contra moradores de comunidades vulnerabilizadas. Ela foi assassinada a tiros, num crime que até hoje permanece sem resposta.

Direitos humanos: o feminismo e a sociedade igualitária

Para Michele Bravos, cofundadora e diretora executiva do Instituto Aurora, que tem como missão educar em direitos humanos, ampliando a compreensão do tema e promovendo diálogos, sua referência brasileira na luta pelos direitos humanos é Lélia Gonzalez.

“Mulher negra, feminista, pesquisadora, que deixou uma grande contribuição para o movimento feminista internacionalmente, a partir da sua perspectiva enquanto brasileira latino-americana.”, descreve.

Segundo Michele, o papel das mulheres na busca de uma sociedade mais justa e igualitária está atrelado ao movimento feminista, que ganha esse nome a partir do século 19.

“São séculos de lutas e de muitas conquistas. É importante lembrar da pluralidade do movimento. Se no começo, mulheres brancas reivindicavam o direito ao voto, mulheres negras reivindicavam o direito de serem vistas como um ser humano, de serem livres”, compara. Ela ressalta que no Brasil, ao longo do século 20 e neste início de século 21, tivemos avanços em importantes leis.

“Conquistamos o direito ao voto e a poder se candidatar e ser votada; a tipificação de crimes como estupro, assédio sexual e importunação sexual; temos lei para defender a mulher vítima de crime cibernético; avançamos muito na discussão sobre a violência contra mulher, sendo que a Lei Maria da Penha é considerada uma das melhores do mundo pela ONU (Organização das Nações Unidas).”

Para a educadora, “ao longo da história, e em cada canto do mundo, temos inúmeras mulheres inspirando e liderando a luta por direitos. Mulheres de todas as idades, etnias, religiões. E cada uma traz uma contribuição importante para a luta a partir de suas realidades. As reivindicações de uma mulher quilombola no Brasil serão diferentes das reivindicações de uma mulher muçulmana no Paquistão. Nós somos plurais e, por isso, nossa luta é plural”, avalia.

À frente do Instituto Aurora, Michele explica que sua visão sobre direitos humanos está baseada num conjunto de princípios que explica o que deve ser uma vida digna para todas as pessoas, independentemente de seu gênero, orientação sexual, raça, classe social, religião, nacionalidade ou qualquer outro fator identitário.

“No Instituto Aurora, consideramos uma visão crítica sobre os direitos humanos, ou seja, entendemos que os direitos são conquistados a partir das lutas sociais.” De acordo com ela, nossos direitos humanos podem ser divididos em cinco categorias: direitos civis, direitos políticos, direitos econômicos, direitos culturais e direitos sociais.

“Na tentativa de tornar o conceito de dignidade mais concreto, de entendimento comum, inclusive internacionalmente, podemos recorrer à Declaração Universal de Direitos Humanos para conhecer quais são os nossos direitos humanos. No Brasil, nossos direitos humanos estão descritos na Constituição Federal de 1988, sendo que um dos documentos base da nossa Constituição foi a Declaração Universal de Direitos Humanos.”

Dia Internacional da Mulher fortalece luta por mais direitos

Como entidade promotora de educação acerca dos direitos humanos, o Instituto Aurora entende que direitos humanos não são estáticos. “Conforme a sociedade vai mudando suas concepções sobre determinados assuntos, podemos perder direitos ou conquistar novos.”

“A educação em direitos humanos é importante, entre vários motivos, para que a gente conheça os nossos direitos e assim saiba reconhecer quando eles estão sendo atacados e impedir que isso aconteça”, justifica Michele.

Segundo ela, a educação em direitos humanos (EDH) desempenha um importante papel também na promoção de uma cultura “em que as pessoas possam se relacionar umas com as outras de forma igualitária, com respeito, sem discriminação, sem violência”.

“No instituto, buscamos mudanças em níveis estruturais, institucionais e individuais. Por isso temos projetos de incidência política, por exemplo. Participamos de um movimento de recuperação do Comitê Estadual de EDH no Paraná e conquistamos isso. Já no âmbito das relações interpessoais, realizamos ações educativas voltadas para a população em geral, estimulando a empatia, a solidariedade e uma convivência livre de discriminações”, cita.

Para Michele, o Dia Internacional da Mulher é uma data para celebrar as conquistas de direitos alcançadas até aqui e para fortalecer a contínua luta por mais direitos. “Enquanto a desigualdade de gênero existir, a nossa luta existirá. Por isso, a data deve servir para trazer visibilidade às pautas que ampliam os direitos das mulheres e conscientizar a população sobre as desigualdades de gênero que ainda devem ser superadas”, finaliza a educadora.

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