Audiência pública realizada nesta quarta na Câmara de Vereadores de Londrina discutiu o sucateamento da UEL, que prejudica os serviços prestados pela universidade na cidade

Mariana Guerin

A Lei Geral das Universidades (LGU) comprometeu a autonomia das instituições de ensino paranaenses, provocando o sucateamento da infraestrutura e dos trabalhos de extensão e pesquisa no Estado. Este é o apontamento feito nesta quarta (23) durante uma audiência pública realizada na Câmara de Vereadores de Londrina para debater os impactos da LGU na crise na Universidade Estadual de Londrina (UEL).

A audiência foi proposta por representantes dos sindicatos dos Servidores Públicos Técnico-Administrativos da Universidade Estadual de Londrina (Assuel) e dos Professores do Ensino Superior Público Estadual de Londrina e Região (Sindiprol-Aduel).

Entre os muitos problemas estruturais enfrentados pela UEL destacam-se a falta de servidores e a terceirização de trabalhadores, a inexistência de concursos públicos e o subfinanciamento, além da não reposição das perdas inflacionárias, que já corroeram, desde 2016, mais de 30% dos salários do funcionalismo público.

Para os sindicatos, o congelamento nos investimentos por parte do governo estadual interfere nas autonomias didático-científica e de recursos e pessoal das universidades, impedindo a realização de serviços essenciais para as comunidades. Conforme o presidente do Sindiprol/Aduel, Ronaldo Gaspar, metade dos investimentos brasileiros em ciências atualmente são da iniciativa pública.

“A pesquisa de base no Brasil é feita pela universidade pública”, destacou Gaspar, reforçando que as universidades paranaenses estão “encolhendo”. “O impacto na economia local é gigante”, avaliou o professor, citando que não há concursos públicos para a contratação de técnicos administrativos na UEL há dez anos e para professores, há sete.

“A terceirização repercute na baixa qualidade do serviço, nos baixos salários e na alta rotatividade de profissionais. Muitos professores de graduação estão sendo contratados em regime temporário, por salários muito aquém do mercado. O trabalho pedagógico fica comprometido e os professores sequer conseguem planejar suas vidas.”

‘Crise é um ataque à ciência’

Para o reitor da UEL, Sérgio Carlos de Carvalho, as dificuldades enfrentadas pelas universidades fazem parte de um contexto de crise mundial, “de mudança no acúmulo de capital desde 2008”. Segundo ele, o Brasil nunca viu a pesquisa como prioridade e, com a crise econômica, este setor ficou ainda mais debilitado.

Ele lembrou que tanto a reforma previdenciária quanto a reforma administrativa atingiram em cheio as universidades, que ficaram ainda mais desestruturadas para manter alunos e pesquisadores.

“A crise é um ataque à própria ciência. A comunidade científica brasileira deve se unir e continuar produzindo e incomodando. Precisamos de mais Estado na educação e produção científica”, opinou.

Edméia Ribeiro, diretora do Museu Histórico de Londrina, reforçou a importância dos órgãos suplementares da UEL para a comunidade. “A UEL tem uma relação direta com a comunidade seja na saúde, no jurídico ou na cultura.”

“A LGU regulamenta as instituições a partir de uma perspectiva pobre e pequena, de quem não reconhece a potência de uma instituição de ensino. Nivelou por baixo as universidades, tirando a autonomia de ensino e pesquisa”, avaliou a diretora.

Conforme ela, o Museu Histórico, em seus 52 anos, é o quarto museu mais visitado do Paraná, recebendo de 30 a 130 visitantes espontâneos por dia, além de cinco a seis escolas da região, em suas ações educativas.

“O museu sobrevive por amor ao espaço, que conta as memórias da cidade por sua arquitetura, pois para dar conta de todos as demandas, que incluem arquivos de imagem e som e documentação, que são os mais procurados, contamos com apenas quatro funcionários: uma secretária, dois técnicos e a direção. Como sobreviver”, questiona Edméia.

LGU: falta de servidores afeta serviços prestados à comunidade

Renato Lima Barbosa, representante do Escritório de Aplicação de Assuntos Jurídicos (EAAJ) da UEL, reforçou que este órgão suplementar promove o acesso gratuito à Justiça para mais de 2,5 mil cidadãos, envolvendo o trabalho de mais de 500 alunos. Segundo ele, o EAAJ vive um momento de defasagem no seu corpo técnico: de 16 técnicos administrativos, o escritório conta hoje com apenas oito servidores.

“É uma dificuldade enorme para tocar o serviço. Tem servidor que não consegue tirar férias porque não tem quem o substitua. Estamos sufocados pelas imposições da LGU.”

A falta de servidores atinge também o Colégio de Aplicação da UEL, que completa 60 anos este ano e atende cerca de 1,4 mil alunos da educação infantil ao ensino profissionalizante. “Somos um importante polo de formação e inovação pedagógica da cidade, tanto para nossos alunos, quanto para os estudantes e professores da UEL, no desenvolvimento de estágios e projetos de pesquisa”, destacou a diretora-geral do colégio, Tania da Costa Fernandes.

Segundo ela, hoje o Aplicação depende completamente dos convênios com o Estado e com a Prefeitura de Londrina para custear a manutenção imediata de suas atividades. Os dois centros infantis contam com apenas um servidor para a limpeza e um para a cozinha em cada unidade e das 22 professoras, apenas seis são concursadas da UEL. “Lamentamos e esperamos não sermos vencidos por esse processo de sucateamento proposto pela LGU.”

Regina Mitsuka Breganó, diretora do Hospital Veterinário da UEL, lembrou que a unidade faz um trabalho muito mais amplo do que cuidar de cães e gatos. “Metade do corpo docente do HV é de substitutos com doutorado, cuidamos de mais de 18 mil animais por ano, mas também produzimos ciência. Estamos entre os 100 melhores hospitais veterinários do mundo.”

Segundo Regina, o HV da UEL é um dos únicos hospitais veterinários ligados a uma instituição pública de ensino com funcionamento 24 horas. “A LGU passou por cima de nós como um trator. Tivemos que reduzimos nosso atendimento para não fechar as portas. Tem momentos que atuo como secretária para não deixar de atender”, lamentou.

Nova assembleias reunirão servidores em Maringá e Ponta Grossa

De acordo com o presidente da Assuel, Marcelo Seabra, será redigido um documento final com os apontamentos feitos durante a audiência pública desta quarta, para ser apresentado em audiências públicas que serão realizadas com servidores das universidades de Maringá e Ponta Grossa, nos próximos dias.

Ele reforçou que professor Aldo Bona, superintendente de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná, foi convidado a participar do debate desta quarta com antecedência, mas não compareceu, assim como nenhum outro representante do Estado.  

A Lei Geral das Universidades foi aprovada pela Assembleia Legislativa do Paraná em 2021. A proposta desenvolve parâmetros para o financiamento e a distribuição de recursos entre as universidades estaduais do Paraná, fixando regras para pagamento de pessoal e estabelecendo critérios para a eficiência da gestão universitária, com base em sua autonomia constitucional.

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