Nos últimos anos, impulsionado pelo projeto neofascista, neoliberal e neoextrativista de destruição da política indigenista, orquestrado pela gestão Jair Bolsonaro, garimpeiros têm invadido sem medo a TI Yanomami
Por Jaqueline de Araújo Vieira*
No início da semana, as redes sociais foram tomadas pela seguinte pergunta: “Cadê os Yanomami?”. A campanha mobilizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) foi originada como desdobramento da denúncia realizada pelo presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi-YY), Júnior Hekurari Yanomami, no dia 25 de abril. O relato de Júnior Hekurari diz que uma menina de 12 anos de idade foi violentada sexualmente por garimpeiros e não resistiu aos ferimentos, vindo a óbito. Além disso, há também o relato de uma outra criança, de três anos de idade, que foi jogada em um rio após sua mãe, tia da menina, ter entrado em confronto com garimpeiros tentando salvá-la.
Após a denúncia, o grupo de cerca de 25 pessoas que vivia na comunidade Aracaçá, desapareceu. No local, apenas vestígio de fogo. Entre os Yanomami é comum durante o rito fúnebre de uma morte que os pertences daquele que partiu sejam todos queimados. Os Yanomami não admitem o acúmulo de mercadorias, visão bastante distinta do capitalismo, por isso, as queimam. Assim, o fogo pode ter sido ateado como retaliação dos garimpeiros, mas pode, também, ter partido dos próprios indígenas, como parte fundamental do luto. Mas na manhã de hoje, 6 de maio, foi confirmado pelo Considi que os Yanomami foram localizados em outra comunidade distante daquela que viviam. Portanto, haviam se refugiado do cenário de guerra.
Fato é que nenhum desses acontecimentos terroristas são novos para essas comunidades. Os primeiros contatos dos Yanomami com os brancos, napëpë em sua língua nativa – que significa, quando traduzido para o português, estrangeiro ou inimigo – ocorreu entre as décadas de 1910 e 1940, quando o extinto Serviço de Proteção aos Índios (SPI) chegou à região junto aos soldados da Comissão de Limites, com o objetivo de demarcar as fronteiras limítrofes no norte do Brasil. De lá para cá, massacres ocorreram e o garimpo sempre foi o grande causador da guerra. Em 1993, doze Yanomami foram mortos por garimpeiros, incluindo mulheres, crianças e idosos, no crime que ficou conhecido como “Massacre do Haximu”. Mais de 22 garimpeiros foram acusados de participar desse massacre, entretanto, apenas cinco foram condenados pelo crime.
Os Yanomami habitam tradicionalmente os territórios do Brasil e da Venezuela. No Brasil, são cerca de 27 mil pessoas divididas em 228 comunidades, incluindo comunidades isoladas, vivendo na Terra Indígena Yanomami (TI) que abarca os estados de Roraima e Amazonas. No total, a TI Yanomami possui cerca de 96.700 km² e foi homologada pelo Estado brasileiro no ano de 1992. É por conta dessa “abundância” de terra, o famoso ditado racista que diz haver “muita terra para pouco índio” que nos últimos anos, impulsionado pelo projeto neofascista, neoliberal e neoextrativista de destruição da política indigenista, orquestrado pela gestão presidencial de Jair Bolsonaro, que garimpeiros têm invadido sem medo a TI Yanomami. E o problema não se resume a essa TI, pois se alastra feito praga até os demais povos indígenas e suas terras. Projeto de Lei (PL) que visa liberar a mineração em terras indígenas, marco temporal, expansão das fronteiras agrícolas, tudo isso faz parte do mesmo projeto de massacre e extermínio iniciado em 1500.
É urgente que o Estado brasileiro cumpra a Constituição Federal de 1988 e garanta a proteção e a segurança dos Yanomamis expulsando todos os garimpeiros do território! Fora Xawara! Fora Garimpo! Leia “A Queda do Céu”, livro de Davi Kopenawa e Bruce Albert.
*Jaqueline de Araújo Vieira é mestranda em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
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