Chris, The Red

Hoje. 28 de maio de 2022. Total de 801 dias se passaram desde 18 de março de 2020. Dia em que eu e meu companheiro, Bruno Novadvorski, entramos em quarentena por conta da pandemia mundial causada pelo Novo CoronaVírus, a covid-19. A quarentena acabou, a pandemia não. Já estou vacinado, esperando a quarta dose. Depois de muita luta, a vacina veio, mas ainda estamos com apenas 59,4% da população mundial vacinada com as duas doses (No Brasil, esta porcentagem é de 76,9%)[1]. Então, ainda há uma estrada longa pela frente, mas após estes mais de 2 anos, quero fazer uma volta àquele dia. 18.03.2020. Sou Chris, The Red. Bixa. Puta. Designer Gráfico. Fotógrafo. Artista. Filho da Zulmirene. Irmão da Ana Caroline. Padrinho do Billy. Marido do Bruno.

Encontrava-me na segunda semana de quarentena. Ficando em casa. Com saídas apenas para o mercado 24 horas que fica em frente à nossa casa. Foi numa destas saídas que o medo do vírus se tornou mais real. No caminho para o mercado, que dura 5 minutos, eu parei, pois o ar me faltou. Por baixo da máscara, meu corpo ansiava pelo elemento tão essencial às nossas vidas: oxigênio. Respiração ofegante. Peito pulsando além do normal. Uma ânsia por um choro que não veio. Era medo de ser contaminado por um vírus que me era um total estranho. Poucas informações ainda tínhamos sobre sua origem e como curá-lo. Medo.“É contra a tendência a sermos capturados por um tal sentimento de medo que é preciso lutar precisamente, nos mantendo ativos e preocupados com os outros e a vida social da qual fazemos parte” (O Medo, José Gil)[2].

Máscara. Em casa. Álcool Gel 70%. Manter distância. Distância de 1,5m. RESPIRAR. Continuar respirando, mas com distância. Esta era a palavra-chave do momento. Também sua similar: isolamento. Sem contato físico. Fotografo corpas desnudas desde 2011. Ao fotografá-las, me conecto, me aproximo, quebro as distâncias. Criamos laços. Mas não poderia mais me aproximar, manter a distância social. Como continuar a fotografar suas corpas? Se o medo era uma certeza, continuar a criar era outra.

A arte, sempre foi este meu caminho para minha saúde física e mental. É neste contexto que surge Corpos em Quarentena (2020-2022)[3]. Ensaio fotográfico realizado online e a distância. De 02 de abril de 2020 a 31 de janeiro de 2022. 102 pessoas foram fotografadas. 42 cidades. 10 países. 102 histórias. Ultrapassou a imagem. Tornou-se conexão. A princípio, idealizado para registrar rostos conhecidos, alcançou o mundo. Ultrapassou fronteiras. Emigrou. Real. Virtual. Tão Presente. Conexão. Espaço. E é justamente neste não tão real, e ainda assim tangível, mas virtual que o fotografar aconteceu e aproximou.

wherebys. facetimes. skypes. whatsapps. messengers etc. Neles, nossas corpas se conectaram. O medo se dissipou. Amizades iniciadas. Afetos compartilhados. A distância diminuiu. Foi neste espaço que a arte continuou. RESISTIU. Ideias. Sensações. Tesão. Descoberta. Corpos. Covid-19. Positivo. Cura. Aprendizados. Construções. Ressignificações. O próprio ato de fotografar se transformou, transmutou, ficou em quarentena. Mas tocou es outres. O ser. A alma. A mente. O coração. Seduziu. Performou. Se permitiu estar desnude perante a câmera, o olhar e, principal e especialmente, a si mesme. Abriu sua casa. Seu quarto. Me levou para a cama.

No celular ou no notebook, a moldura para a sua beleza. Abriu-me o caminho, me cedeu passagem em seu íntimo. Me fez confidente. Amigo. Contou-me seus segredos. E seus medos. Há amor. Há afeto aqui. Para mim. Para ti. Para elus. Nas fotografias em preto e branco. Há nós. Bruno. Cláudio. Edson. Suellen. Fefa. Marcelo. Pedro. Colin. Marcelo. Cláudio. Daniel. Edson. Luciano. Marina. Paulo. B. Gilberto. Jorge. Paulo. Julio. Junior. Flávio. Marcus. Bruno. Darren. Vicente. Dan. Marshall. Paulo. Carles. Bruno. Marcos. Danny. Murilo. Sebastián. Mario. Profânia. Giuseppe. Jhonattan. Lucas. Frank. Andrew. Leonardo. Johnny. Abhiyana. Harlen. Yago. Lucas. Fábio. Ruanes. Gabeeh. Angelus. Paulx. Fernando. Italo. Leo. Luciano. Vinicius. Julio. Régis. Jeffe. Rafa. Daniel. João. Augusto. Paulo. Igor. André. Luciano. PC. Cláudio. Wesller. Buck. João. Daniel. Ney. Daiv. Marcos. Pedro. Red. Naiara. Rogério. Pinky. Sadan. Lufer. Rainnery. Carlos. Chronos. Wiccano. Kawan. Yakini. Dog Kafan. Luiza. Alan. Alex. Murilo. Thiago. Ana. Felipe. Diego. Gustavo. Chris.

Mais que Corpos em Quarentena. Somos Seres. Resistindo. Vivendo. Se transformando para o mundo que virá. O voltar não existe. É daqui para adiante. Se faz imprescindível refletir. O futuro é incerto. A única certeza: estas pessoas existem em mim e aquilo que nos distancia e nos aproxima parte do que escolhemos. A covid-19 nos distanciou, mas as escolhas feitas nos aproximaram. O projeto Corpos em Quarentena encerrou em janeiro de 2022. Já as aproximações construídas, não têm data de expiração.

*Entretons é um grupo de pesquisa e extensão de gênero, sexualidade, teoria queer, feminismos, decolonialidades, na perspectiva das interseccionalidades de etnia, raça, classe social, etarismo, entre outras. Formado por pesquisadores da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e outres colaboradores de diferentes territórios de pesquisa e extensão, o grupo objetiva produções e ações implicadas com a realidades sociais diversas e seus movimentos.

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