Por Vinícius Fonseca*
Neste texto eu quero falar de algo que me tocou muito na última semana. O discurso do reitor da Universidade Federal do Paraná UFPR), professor doutor Ricardo Marcelo Fonseca.
Não, apesar do mesmo sobrenome, que eu saiba não temos parentesco, embora me sentisse honrado se tivéssemos.
As palavras do professor reacenderam em mim a chama da esperança, sobretudo quando ele disse que o papel das instituições de ensino superior, principalmente as públicas, é o compromisso com a pesquisa e com a real compreensão de que o ensino superior deve ser a extensão e assim dar continuidade ao ensino de base.
Talvez você me pergunte, mas até aqui qual a relação com as Pessoas Com Deficiência (PCDs), se o discurso falou de um modo geral sobre a educação?
(Confira o discurso do reitor Ricardo Marcelo Fonseca no vídeo abaixo, a partir do minuto 3’40”)
Permita-me fazer um apanhado sobre a minha trajetória próxima à educação e talvez você entenderá. Ainda me falta entregar o artigo da especialização em Metodologia do Ensino Superior, pós-graduação cursada na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Em meu trabalho de conclusão decidi analisar como é tratada a questão da acessibilidade do público PCD às faculdades e universidades do País.
Deveria ter entregado o artigo no final de 2022 e não consegui. Muito disso é minha responsabilidade e eu admito, mas existe uma outra coisa que pesou muito no processo, a estafa mental.
Eu estava cansado, triste e sem esperança. Desde 2018 para cá, a educação, em todos os seus níveis, e a pesquisa científica têm sofrido ataques sistemáticos, seja pelo corte de verbas, seja pelo discurso de quem parece odiar o conhecimento e seus benefícios ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária.
O último golpe desferido contra mim, aquele que foi fatal para a minha disposição de seguir na pesquisa, veio em agosto de 2022, quando o então Ministro da Educação, Milton Ribeiro, insinuou ser difícil conviver com pessoas com certo grau de deficiência e, em razão disso, a presença deste público nas escolas atrapalhava o ensino e desenvolvimento dos demais alunos.
Lembrei de quando eu era uma criança e da luta dos meus pais para convencer a escola de que eu tinha condições de estudar em uma sala com crianças sem deficiência. No meu tempo existiam as salas exclusivas para PCDs e devido ao meu enquadramento, hipóxia neonatal (falta de oxigenação do cérebro durante o parto), aquela turma seria meu destino primeiro. No entanto, minha mãe pediu uma chance à direção e ela foi concedida.
Confesso que não tinha a dimensão disso e só fui ter a compreensão do que aconteceu depois de ter mais idade. Fato é que meu período pré-escolar foi, na verdade, um teste em que eu provava, sem saber, que tinha condições de estar ali.
Consegue imaginar agora como dói ouvir um ministro da educação dizer, em outras palavras, que lugar de criança com deficiência é em casa e não na escola porque atrapalha?
Não se preocupe, eu não perdi o bom senso! Eu sei que a depender da deficiência, o aluno precisa de um atendimento diferenciado e especializado, muitas vezes de uma escola voltada ao atendimento de pessoas com deficiência, porém, entendo também que é papel do Estado fornecer condições para que cada criança ou adolescente com deficiência possa ser avaliado e crie assim suas próprias oportunidades.
É por isso que discursos como o do professor reacendem em mim a esperança. É por isso que ao ver o presidente, no “revogaço” dos primeiros dias, ter acabado com essa diretriz, aquece meu coração. Mesmo quando o Ministério da Educação anunciou o fim da Diretoria de Educação para Surdos e depois voltou atrás e se justificou, ainda fico feliz.
Para mim, o problema não está em dizer coisas que desagradam os outros e depois voltar atrás, o problema, ao meu ver, sempre estará em quem discursa de modo preconceituoso e aproveita do seu poder para impor ideias limitantes aos outros.
Talvez o atual governo e os reitores não consigam alcançar tudo o que eles parecem almejar em seus discursos. Aguardemos para ver como isso será posto em prática; aguardemos com esperança.
*Vinícius Fonseca é pessoa com deficiência, jornalista, tecnólogo em gestão de Recursos Humanos com especialização em assessoria em Comunicação e M.B.A. em Gestão de pessoas. Também é escritor de poesias e contos, além de um eterno curioso.
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