Samuel Vitor Marcondes Leal, de apenas 16 anos, foi baleado dia 19 de janeiro, no Jardim Silvino, em Cambé

Nelson Bortolin

Foto em destaque: arquivo pessoal

Com apenas 16 anos, Samuel Vitor Marcondes Leal foi morto pela Polícia Militar na madrugada do dia 19 de janeiro, no Jardim Silvino, em Cambé.

A justificativa da PM para mais uma morte é a mesma: foi realizada uma abordagem na qual o suposto criminoso reagiu com arma de fogo. E, aos policiais, não restou alternativa a não ser atirar de volta.

Essa é a explicação dada pela Polícia para dezenas de óbitos que ocorrem todos os anos na região de Londrina.

Mas, nesses alegados “confrontos”, só um lado é atingido.

“Amigos do meu filho encontraram com ele pouco antes da morte. E contaram que ele não estava armado. Os meninos disseram que abriram a porta do carro e convidaram o Samuel para ir embora com eles, mas o Samuel disse que tinha de fazer uma entrega ainda”, conta a mãe Silvana Leal (53 anos).

O filho era usuário e também vendia drogas.

“A Polícia diz que meu filho estava com um revólver 32. Imagina o absurdo: você acha que alguém vai enfrentar a Rotam (Rondas Ostensivas Tático Móvel ) com uma arma dessa?”, questiona.

Para Silvana, nada justifica a morte do jovem, mesmo que ele tivesse armado e corrido dos policiais. “Por que não deram um tiro na perna, no braço? Por que tinham de matar?”

O laudo do Instituto Médico Legal (IML) só chega para a mãe no dia 19 de fevereiro. Mas ela diz que, na funerária, contaram que o corpo do jovem tinha nove perfurações, sendo pelo menos uma no tórax.

Silvana afirma que, só após a morte do filho, soube que ele estava sendo ameaçado. “Samuel mandou mensagens para amigos contando dessas ameaças”, alega.

Dias antes, uma amiga do jovem teria pedido para que ele mudasse de vida. “Se der tempo, se não me matarem, eu vou mudar”, teria dito o adolescente.

Minutos antes de morrer, Samuel mandou mensagem por aplicativo para essa amiga, dizendo que estava “foragido”. “Pelo amor de Deus, Samuel, vai embora desse lugar”, disse a amiga. “Não dá mano. É a Rotam”. “Se pá, vou preso.”

Essas foram as últimas palavras ditas pelo adolescente.

“Estou muito mal. Não tinha necessidade disso. Atrás de um jovem tem sempre uma mãe sofrendo. Será que ninguém vê isso?”, questiona Silvana.  Samuel era seu único filho.

Morte provoca sensação de impotência

“Eu me sinto impotente por não conseguir agir para evitar que essas mortes ocorram e por elas adquirirem pouca visibilidade e repercussão na cidade onde trabalho e moro.” A declaração é do psicólogo Rodrigo Prado Evangelista, do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) de Cambé, que acompanhou Samuel Leal no ano passado, quando o jovem cumpria medida socioeducativa em meio aberto.

Desde que atua no Creas, essa é a segunda vez que o psicólogo vê um jovem atendido por ele ser morto pela Polícia. A outra morte foi a de Ítalo Silva Rodrigues, baleado pela PM aos 17 anos dia 2 de janeiro do ano passado. “Soube de mais uma pessoa que foi atendida por mim e foi morta pela Polícia, mas já não estava em cumprimento de medida socioeducativa quando foi assassinada e já havia completado 18 anos”, conta.

Segundo o psicólogo, Samuel estava em processo de acompanhamento, mas não era assíduo e já estava com várias faltas. “A última vez que o vi foi no dia 4 de outubro, quando realizei uma visita domiciliar junto com o assistente social que trabalha comigo”, lembra. 

Ele afirma que Samuel era “mais participativo” quando atendido junto com outros adolescentes. “Nessas ocasiões, se demonstrava bastante comunicativo. Gostava de música, de funk. Tanto eu como a equipe buscávamos encontrar formas para ele ampliar mais os horizontes e perspectivas de vida.”

Segundo ele, 65% dos adolescentes referenciados no Creas relatam ter sofrido violência policial ao menos uma vez na vida. Mas a imprensa só dá voz à Polícia. “No momento, buscamos nos reunir com os serviços, entidades e instituições que integram a rede de educação visando encontrar alternativas para que as diversas formas de violência policial saiam da situação de invisibilidade”, declara.

A Rede Lume procurou a PM para que a instituição se pronunciasse a respeito da morte do adolescente. Mas a assessoria não deu retorno.

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