Estudo da Defensoria também mostra que 38% sequer têm passagem policial; só três casos viraram ação penal
Nelson Bortolin
Foto em destaque: Protesto de familiares contra mortes pela polícia em Londrina
Menos da metade das 302 pessoas mortas no Paraná pela Polícia Militar (47%) entre 1º de janeiro e 28 de outubro de 2021 tinham condenação criminal e 38% delas sequer contavam com passagem pela polícia. Somente três casos, ou 0,99% do total, foram objetos de ação penal. Os números fazem parte de um estudo divulgado esta semana pelo Núcleo da Política Criminal e da Execução Penal (Nupep), da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR).
Eles fazem parte da nota técnica 003/2022, expedida pelo órgão, que foi entregue à Secretaria de Segurança Pública do Paraná e ao comando da PM no Estado no dia 6 de dezembro do ano passado. “Decidimos analisar esses dados porque há uma narrativa corrente no Brasil que tenta naturalizar a grande quantidade de mortes por ação policial no País, o que é incompatível com um Estado Democrático de Direito”, afirma a coordenadora do Nupep, a defensora pública Andreza Lima de Menezes.
Em ao menos 20 dos casos, segundo a nota técnica, há evidente excesso de uso da força letal, com o disparo de dezenas de tiros contra os civis. Num deles, cinco policiais militares fizeram 96 disparos contra três pessoas. Em outra situação, os policiais dispararam 58 tiros contra dois suspeitos. Um foi alvejado com três tiros na cabeça.
Pessoa com deficiência
Na análise da Defensoria foi descrito um caso em que os policiais usaram força letal contra um rapaz em sofrimento mental conhecido da população onde morava e que os havia agredido com um pedaço de madeira.
“A legislação preconiza que o uso imediato de força para conter um suspeito que se mostre agressivo deve ser proporcional ao estritamente necessário para conter a violência. O homem for morto, o caso foi arquivado sob alegação de legítima defesa e o uso excessivo da força também não foi considerado”, diz a nota técnica.
Investigação militar
O estudo cita que, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), crime doloso contra a vida de civil praticado por policial militar não é crime militar. E, portanto, precisa ser investigado pela Polícia Civil. Mas, no Paraná, convencionou-se que a PM realiza a investigação preliminar sobre casos de mortes causadas por intervenção policial.
Das 302 mortes analisadas, 157 foram investigadas simultaneamente pelas polícias Civil e Militar. Em 14 casos, foram abertos somente inquéritos policiais militares. Em 123, foram encontrados apenas inquéritos policiais da PC e nos oito casos restantes, não foram localizados dados que permitissem afirmar se foi ou não aberta investigação.
No estudo, também chama a atenção o fato de os policiais oficiais encarregados de coordenar os inquéritos policiais militares (IPM) sempre pertencerem à mesma unidade em que o investigado está lotado.
Matança de jovens
Dos casos analisados, houve morte de apenas uma mulher. Em todos os outros, os mortos eram homens. Em sua grande maioria – 56% – eram pessoas de até 39 anos. Os óbitos de civis com até 25 anos de idade representaram 28,5% do total.
A cor da pele das pessoas mortas é definida no estudo pelo laudo de necropsia: 35% brancas e 36%, pretas. Não foi possível identificar essa informação do restante.
Cena do crime alterada
O Código de Processo Penal, em seu artigo 6º, dispõe que a autoridade policial deve preservar o estado e conservação do cenário do crime, acionar a perícia, elaborar o Boletim de Ocorrência e aguardar que os peritos examinem o local dos fatos.
A análise dos casos, no entanto, mostra que a conduta comumente assumida por parte dos policiais militares, após o suposto confronto, é a apropriação da arma de fogo do civil morto e, apenas em momento posterior, a sua entrega ao perito. Isso ocorreu em 172 casos ou 53,41% do total.
(Com informações da assessoria de comunicação)
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