Desde que ginecologista atuante na Universidade foi denunciado por estudante, surgiram relatos de violência de gênero cometidas pelo médico anos atrás
Cecília França
Manifestantes realizaram nesta segunda-feira (27) atos contra o assédio, na Universidade Estadual de Londrina (UEL), após denúncias contra um médico ginecologista atuante na Dasc (Divisão de Assistência à Saúde da Comunidade) da instituição. Foram dois momentos: ao meio-dia, com cortejo até a reitoria, e no fim da tarde, com panfletagem em frente ao Restaurante Universitário. No mesmo dia, a Ouvidoria da UEL recebeu nova denúncia contra o mesmo profissional, Mário Sérgio Azenha de Castro.
Segundo informações levantadas pela reportagem, uma estudante recebeu o panfleto informativo no ato, relatou o desejo de registrar denúncia contra o profissional e pediu orientação. Foi repassado a ela o contato da Ouvidoria da UEL. Hoje, a Coordenadoria de Comunicação confirmou formalização de nova denúncia, mas não há como confirmar se partiu da estudante motivada no ato. Os detalhes permanecem sob sigilo.
Lidar com as vias institucionais é importante para o registro dos casos e cobrança por punição. Integrante da Frente Feminista de Londrina, organizadora dos atos, Ana Letícia diz que motivar denúncias era um dos objetivos, mesmo diante da invalidação imposta à palavra das mulheres pela sociedade.
“Quando a gente fala dessa sociedade capitalista, patriarcal, racista, a gente fala de um sistema todo que violenta, que oprime. Então a mulher já é colocada nesse lugar de dúvida. Ela é violentada, ela é duvidada. Pode ter 30 mulheres trazendo a denúncia, basta um homem dizer que não e pronto. Esse valor à voz da mulher devia ser levado de outra forma”, argumenta.
As denúncias contra o médico motivaram o ato, mas as organizadoras fazem questão de destacar o objetivo mais amplo da movimentação.
“A gente está trazendo que o objetivo não é só cobrar punição – nesse caso, que perca o CRM, não atenda mais – o objetivo é trazer o assunto, porque não é um caso isolado, não acontece só aqui, acontece dentro de casa, no trabalho, no meio de transporte. A ideia é trazer e falar sobre esse assunto para que as mulheres também tenham acesso, saibam que isso é assédio, falar dessa cultura patriarcal, machista, que permite que os homens tenham esse tipo de comportamento”, explica Ana Letícia.
Para a ativista, quando casos assim acontecem em serviços de acolhimentos, como os de saúde, chocam e deixam sequelas ainda mais profundas. “Isso tem um impacto na vida da mulher, porque ela é violentada de novo. Quantas mulheres e pessoas com útero já têm medo de recorrer a esses serviços; quantas descobrem doenças gaves muito tempo depois porque não recorreram; então quando acontece com profissional, isso toma uma dimensão muito maior”, pontua.


UEL cria GT para levantar debate
A UEL criou o Grupo de Trabalho Políticas Institucionais de Prevenção e Combate à Violência Sexual e de Gênero para tratar dos casos. A docente Martha Ramirez representou o grupo durante o ato, solidarizou-se com as vítimas e classificou as denúncias contra o médico como um pivô para o debate.
“O caso do do médico da Dasc é o pivô para a gente tornar público esse debate, tornar pública essa discussão e colocar a mão na massa”, declara. “Também estou aqui para me solidarizar com todas as pessoas que foram agredidas, não só por esse profissional, mas também na sala de aula, e convidá-los pessoalmente para que denunciem, para que essas denúncias cheguem aos canais oficiais. Esse problema não é exclusivo da UEL. A maior parte das universidades, nos últimos anos, tem criado politicas de prevenção de violência sexual e de gênero e a UEL não pode ficar à margem desse movimento”.




Carla Pagnossim, psicóloga do Sebec (Serviço de Bem Estar à Comunidade), convocou mulheres que tenham passado por situações de assédio na instituição a denunciar, mesmo a que já tenham formalizado mas não tenham tido solução para seus casos. De acordo com ela, a vigilância desses registros não vinha sendo feita na universidade nos últimos anos.
“Sempre que se podia se tentava por debaixo dos panos, se tentava uma mediação, uma conciliação e não se registrava o que acontecia. A gente tem que ser vigilante desde o processo de registrar, seja de forma anônima, seja de forma nomeada, e de acompanhar esse registro. Acho que a gente tem que ficar muito atenta também aos assédios morais”, destaca.
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