Caderno de Estudos do Fórum Desenvolve Londrina apontou soluções para melhorar as perspectivas de trabalho e renda para moradores de territórios vulneráveis da cidade
Mariana Guerin
Foto em destaque: Vivian Honorato/N.com
Mapear e diagnosticar os territórios vulneráveis, sua população e necessidades, para construir um plano que envolva governanças territoriais, entidades, empresas e lideranças. Esta foi uma das conclusões do 16° Caderno de Estudos do Fórum Desenvolve Londrina, que em 2022 estudou o tema “Londrina de Todos – Perspectivas de trabalho e renda para londrinenses em situação de vulnerabilidade”.
Os resultados dos trabalhos realizados no ano passado pela entidade foram apresentados nesta quinta-feira (16) no auditório da Unimed Londrina. Na ocasião, os representantes do Fórum mostraram, ainda, dados do Manual de Indicadores de Desenvolvimento de Londrina, com a XI Pesquisa de Percepção da População sobre a cidade.
O caderno de estudos sistematizou um conjunto de propostas para melhorar as condições de vida de londrinenses em situação de vulnerabilidade, relacionadas, principalmente a trabalho e renda. Dez propostas se destacam:
- Mapear e diagnosticar os territórios de pobreza e vulnerabilidade social e cadastrar as famílias para compor um plano comum de ação conjunta dos setores público e privado.
- Promover a redução da vulnerabilidade nas áreas periféricas de Londrina por meio de governanças territoriais que envolvam entidades, clubes de serviços, associações de classe, empresas, lideranças e, especialmente, as pessoas que nelas vivem.
- Construir uma agenda anual de prioridades para cada território vulnerável definida com a participação efetiva dos próprios moradores.
- Integrar e articular as Políticas Públicas (saúde, educação, emprego, entre outras) e fazer com que elas cheguem até as pessoas que moram nas áreas vulneráveis.
- Articular uma rede de entidades e pessoas para receber demandas de moradores de lugares vulneráveis e auxiliá-los no acesso às entidades formadoras de mão de obra ou que possam oferecer oportunidades para mudarem de vida.
- Priorizar o atendimento às mulheres, crianças e adolescentes com apoio da rede de proteção e do acesso à educação/capacitação, ao trabalho digno, ao lazer e a cultura.
- Engajar as instituições de ensino superior em ações que promovam programas de extensão universitária focados em áreas de vulnerabilidade.
- Alinhar a oferta de cursos formais e capacitações à realidade do público e do mercado, considerando as deficiências de formação na educação básica e as condições de vida das pessoas das regiões vulneráveis.
- Conscientizar as associações e empresas do compromisso social com a qualificação das pessoas em situação de vulnerabilidade e da importância de receber menores aprendizes.
- Implantar equipamentos públicos nos territórios vulneráveis para melhor desenvolver oportunidades de ocupação e renda, caso das hortas comunitárias, incubadoras e cooperativas de reciclagem.
Essas propostas surgiram após o contato dos membros da entidade com as comunidades londrinenses. Paulo Sendin, um dos fundadores do Fórum Desenvolve Londrina, cita que, durante 2022, foram realizadas 17 palestras, além do Fórum em Debate, com o intuito de obter informações e análises sobre os problemas e causas das situações de desigualdade.
“Nesse processo de conhecimento da realidade, o estudo inovou em sua metodologia, realizando uma ‘visita técnica’ para conhecer de perto a realidade das regiões em situação de vulnerabilidade.”
“As expressões que definiram o que são essas regiões em situação de vulnerabilidade foram marcantes: ‘cidade invisível’ ou uma ‘não cidade’”, diz Sendin.
“De fato, o que se observa é que a grande maioria da população londrinense não ‘vê’ essa parte da cidade. É como se essas regiões em situação de vulnerabilidade simplesmente não existissem, embora abriguem uma parcela relevante dos londrinenses.”
“Essa falta de percepção da existência dessa ‘cidade invisível’, nos leva a uma outra expressão que surgiu nas palestras: a necessidade de que as ações nessas regiões sejam feitas por pessoas que ‘gostem de gente’”, completa Sendin.
Para ele, o que ocorre, muitas vezes, é que os agentes públicos que estão nessas localidades, e mesmo em outras nem tão carentes, atuam de forma ‘profissional’, sem a necessária empatia.
“Se o agente público, ou voluntário, não conseguir se colocar no lugar das pessoas que vivem nessa situação de vulnerabilidade e demonstrar que ‘gosta de gente’, dificilmente vai ajudar a promover as mudanças necessárias”, avalia o gestor.

Vulnerabilidade: quais os apontamentos do caderno de estudos
Entre os principais problemas percebidos nas “visitas técnicas” do Fórum às comunidades, destacaram-se a fragmentação e carência das políticas públicas nesses territórios. Muitos programas sociais são ineficazes ou estão desconectados com a realidade do território.
O estudo aponta que trabalhos importantes realizados por pessoas que moram em áreas vulneráveis não têm o reconhecimento nem a remuneração condizente com sua importância, como acontece com os catadores.
Também falta engajamento efetivo das universidades em ações que promovam o desenvolvimento de Londrina por meio de projetos de extensão em territórios vulneráveis.
O caderno de estudos apontou que a oferta de capacitações está desalinhada da realidade do público e do mercado: os cursos formais ofertados não chegam aos moradores de territórios vulneráveis.
Também falta disponibilizar capacitação nos locais de vivência, há poucas oportunidades na área de Tecnologia da Informação para os jovens menos favorecidos e a falta de educação básica dificulta o acesso aos cursos técnicos e de aperfeiçoamento ofertados.
Foi apontada ainda a carência de oficinas criativas nos bairros, para educação e trabalho, que possam gerar renda, e a necessidade de formação de artesãs nas diversas fases da produção de produtos sustentáveis.
Há, ainda, a desarticulação entre empresas e órgãos que trabalham com adolescentes aprendizes, resultando em cotas não utilizadas. Isso provoca experiências de trabalho negativas para os jovens destes territórios.
O Fórum descobriu que há pouca divulgação das ações sociais e empreendedoras na cidade. Há dificuldade para divulgar as oportunidades de capacitação para a comunidade de baixa renda e dificuldade para se comunicar com as pessoas mais vulneráveis sobre capacitações gratuitas e oportunidades de trabalho.
Quanto ao papel do poder público, o caderno de estudos aponta que os servidores públicos e políticos estão distantes da realidade das comunidades carentes e que a grande maioria nunca esteve nesses territórios.
Falta continuidade às políticas públicas de apoio à agricultura urbana e de abastecimento com produtos da Agricultura Familiar e falta recursos e pessoas capacitadas para atender crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, assegurando o acesso à educação, lazer, cultura etc.
Sem um Cadastro Único atualizado por território, o atendimento das pessoas em situação de vulnerabilidade pelas várias secretarias municipais fica fragmentado e as ações desarticuladas. Não há uma política pública multisetorial direcionada à criação de trabalho e renda nos territórios vulneráveis.
A pesquisa reconhece que a sociedade desconhece a realidade dos territórios vulneráveis e por isso não se engaja nem propõe soluções. Falta um diagnóstico que mapeie as dificuldades e demandas dos territórios periféricos de Londrina, além da ausência de uma base de dados do voluntariado que atua na cidade.
É preciso implementar equipamentos públicos
“Um ponto importante é a necessidade de implementação de equipamentos públicos que possibilitem melhor oportunidade de emprego e renda, alinhados com ações de formação e capacitação, envolvendo instituições de ensino superior, escolas técnicas, sistema S e empresariado”, destaca o professor Leandro Henrique Magalhães, presidente do Fórum Desenvolve Londrina.
Ele explica que o Caderno de Estudos foi construído a partir uma “diversidade de visões, possibilitando uma riqueza nas discussões e a identificação, a partir das falas dos especialistas, de dificuldades enfrentadas e possíveis soluções”.
Entre as informações contidas no estudo estão índices de criminalidade e segurança em Londrina, percepção do londrinense sobre a situação de vulnerabilidade de pessoas vivendo em determinadas regiões do município, transformações com base em educação, trabalho e renda e o conceito de “cidades invisíveis”.
O presidente do Fórum reforça que a entidade trabalha sempre com uma visão de futuro e o foco dos estudos projetam ações que devem ser implementadas até 2034.
Abordagem deve ser multidisciplinar
Para Adelar Motter, membro fundador do Fórum, A compreensão das áreas urbanas vulneráveis em Londrina, em sua maioria localizada nas bordas da cidade, requer abordagem multidisciplinar dos diversos problemas presentes, bem como de suas interações.
“Esses problemas costumam ser divididos em ao menos oito temas: trabalho e renda, infraestrutura básica, mobilidade urbana, moradia adequada, saúde pública, educação, segurança pública e capital social.”
Martinha Clarete Dutra, coordenadora de Mediação da Secretaria Municipal de Educação de Londrina, destaca o trabalho da Rede Intersetorial de Proteção à Criança e ao Adolescente.
“Constitui função da rede conhecer as situações de vulnerabilidade que causam desproteção social, como também, conhecer as potencialidades dos territórios, para o estabelecimento de ações coletivizadas de enfrentamento a situações de vulnerabilidade e risco vivenciados pelas crianças e adolescentes e suas famílias.”
Lua Gomes, coordenadora do Conexões Londrina e da regional da Central Única das Favelas (CUFA) no Norte do Paraná, apresentou seu trabalho para os integrantes do Fórum, em uma palestra, em 2022. Leia mais sobre a palestra na matéria da Lume: Quando a ‘quebrada’ vai ao Centro contar sua história.
“Buscamos ajudar indivíduos e famílias vulneráveis a passar por momentos de dificuldades e galgarem passos próprios. Porém, sozinhos, não conseguimos alcançar todos os objetivos. Contamos com o apoio e a ajuda de uma rede de pessoas voluntárias que doam e se doam e novas parcerias são fundamentais para atingirmos o fim”, declara a ativista.
Policiamento de Proximidade
O tenente-coronel Marcos Tordoro, comandante do 30° Batalhão da Polícia Militar do Paraná, alerta para a importância do Policiamento de Proximidade, que inova na forma de agir em relação ao policiamento ostensivo, especialmente por conta da interação e da divulgação estratégica de informações usando as redes sociais.
“Consiste em realizar ações de polícia com foco na prevenção qualificada, buscando diminuir os índices criminais e elevar a sensação de segurança. Fundamenta-se na transparência e na sustentabilidade das próprias ações.”
“O que eu tenho aprendido, com todas as ações acertadas e, inclusive, com os erros é que poucas pessoas querem se envolver com as ações para resolver problemas ligados à segurança pública. Mas basta começar e provocar mudanças para que, pelo constrangimento, muitas outras se mobilizem”, diz Tordoro.
Segundo ele, “não é fácil, nunca foi e nem será, mas é possível e necessário que façamos o que tem que ser feito para alcançarmos os resultados, que precisam e devem ser alcançados: melhoria na sensação de segurança e diminuição do medo. Para isso é necessário investir em comunicação e capacitação e nas pessoas: cuidar do capital humano”.
Sobre o Fórum
Para 2023, o Fórum já iniciou as discussões sobre o tema do estudo do ano, com base em indicadores da cidade, que será relativo ao crescimento das atividades empresariais no município de Londrina.
A entidade não governamental é formada por 38 instituições representativas do município, com o objetivo conjunto de examinar soluções comunitárias em prol do desenvolvimento sustentável.
Criado em 2005 como Fórum Permanente de Planejamento Estratégico para o Desenvolvimento Sustentável de Londrina, a iniciativa trabalha com mais de 60 indicadores (primários e secundários), já editou 17 manuais de Indicadores, 16 estudos sobre o município de Londrina e 11 pesquisas de percepção do londrinense sobre a cidade.
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