Altair Aparecido de Souza diz que a polícia perseguiu seu filho Carlos Henrique Silva de Souza por vários anos antes de matá-lo

Nelson Bortolin

Foto em destaque: Reprodução

“Eu queria agradecer os policias que juraram meu filho de morte desde 2014. Eu queria agradecer os senhores por terem um treinamento excelente. Arrebentaram o peito do meu filho e falaram que foi confronto. Isso é bacana para caramba. Vocês têm um treinamento excelente, continuem assim.”

O depoimento de Altair Aparecido de Souza sobre a morte do filho alterna revolta e ironia. Ele participou do debate “Letalidade Policial: um retrato da violência no Paraná”, realizado pela Rede Lume e a Rádio UEL FM, no campus da universidade, na noite da última quarta-feira (15).

Altair de Souza contou que os três filhos são
ameaçados de morte pela PM/ Foto: Mariana Guerin

O filho Carlos Henrique Silva de Souza foi morto pela polícia em Cambé, no dia 23 de fevereiro, aos 23 anos.

“Tem tanta gente inocente morrendo aí por causa de vocês. Não é toda a polícia. É uma pequena parte da Rotam e do Choque que faz isso. Câmeras em vocês para vocês se defenderem e a gente também.”

“Meu filho foi morto porque estava com mandado de prisão por causa de cinco trinca-ferros (pássaros) que estavam em casa. A juíza de Cambé decretou a prisão dele por causa de cinco trinca-ferros. E vocês tiraram a vida de meu filho por causa de cinco trinca-ferros. Vocês acham justo né?”

“Eu sei muito bem o quanto vocês ameaçaram. Vocês falaram na minha cara que iam matar meus três filhos. Já mataram um, ainda tem mais dois. Eu não esqueci disso.”

“No dia 24 de junho do ano passado, vocês abordaram meu filho e ameaçaram ele. Meu neto de 4 anos que deveria acreditar na polícia chegou em casa chorando: ‘Vô, a polícia vai matar meu pai’.”

“Hoje, tenho mais medo da polícia que de bandido.”

“Uma minoria de policias que deveriam vestir a farda e servir à população são milicianos: decidem quem vive e quem morre. Depois vai para julgamento, faz todos os trâmites. E o que dá? ‘Ah, era um Zé Arruela, um bandido. Vamos arquivar e pronto’. Fica desse jeito.”

“As ameaças continuam. Segunda-feira, vocês passaram atormentando minha nora. Vocês já mataram meu filho. Para que ficar atormentando?”

‘Meu filho tinha passagem’

“Meu filho tinha passagem. Foi preso em 2014 e, a partir de 2014, começou essa perseguição. Ele cumpriu até 2018 e saiu (para regime semiaberto). Mas não podia ter mais nenhuma passagem. Eu admiro muito um juiz que faz isso. Tinha uns passarinhos lá em casa a juíza carcou dois anos e dois meses para poder fechar a cadeia dele.”

“Em 2020, tentei denunciar. Fui no Ministério Público que me mandou para a Polícia Civil. Fui na Civil que me mandou para a boca da onça (PM). Ninguém aceitava minhas denúncias de que estavam ameaçando meus filhos.”

“Em 23 de setembro do ano passado, eu fui na Corregedoria fazer a denúncia. Fui muito bem atendido, mas disseram que tem de ser eles (os ameaçados) para denunciar, não pode ser o pai. Mas na hora de enterrar, sou eu que tenho de enterrar. Dei os nomes aos bois, mas foi arquivado lá.”

“Na terça-feira, dia 22, meu filho foi abordado duas vezes. Tinham mandado de prisão para prendê-lo, mas não prendiam. Só ameaçavam.”

“Em dezembro foi feita uma abordagem na frente de casa. Eu tenho todas as filmagens. Não prenderam.”

“No dia 23 de fevereiro (antes da morte), fizeram nova abordagem e também não o prenderam. Colocaram GPS no carro do meu filho para poder saber para onde ele se deslocaria.”

“Ele tinha os problemas dele, vendia os produtos dele, mas nunca mandou matar ninguém.”

“(O jovem foi seguido pelos policiais) Ele perdeu o controle do carro num quebra-molas. A polícia parou, afastou as pessoas que estavam passando. Meu filho estava com as mãos na cabeça (segundo testemunha). Ele pediu para não matá-lo porque tinha duas filhas para cria. Os policiais o chamaram de desgraçado e disseram: ‘Chegou sua hora, você vai morrer agora’. Aí meteram um monte de tiro no peito dele.”

“Meu filho não tinha armas. Tenho testemunha que viu colocarem a arma a uns 5 metros do corpo. O policial afastou e gritou: ‘Aqui está a arma’. Então, o cara levou um monte de tiro, não deflagrou um tiro, e ainda jogou a arma cinco metros de distância? Que confronto é esse?”

“No momento da ação eu estive presente e a gente fica com sangue fervendo. E aí acabei expressando para eles que eu já tinha ido denunciar eles anteriormente.”

“Aí os policias da Rotam, tinha uns oito ou dez, olharam na minha cara e riram. Falaram para eu ir lá (Corregedoria) de novo e ficar chorando. Eu fui atrás de ajuda. Eles sabem disso e riram na minha cara.”

Debate promovido pela Rede Lume e UEL FM reuniu familiares com representante do Gaeco, Defensoria Pública e pesquisadora do juvenicídio. Confira a reportagem completa aqui.

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