Projeto da fisioterapeuta Cássia Giuliane Costa Santos busca favorecer a experiência de trabalho de parto
Cecília França
Foi quase no final de sua graduação em fisioterapia pela Universidade Federal do Sergipe que Cássia Giuliane Costa Santos teve contato com a obstetrícia. Decidiu que seguiria por ali seu aprimoramento profissional e entrou na residência em uroginecologia e obstetrícia funcional da Universidade Estadual de Londrina (UEL), a única do Brasil. Os estudos terminaram em fevereiro deste ano e como trabalho de conclusão Cássia faz uma proposta inovadora: a oferta de fisioterapia obstétrica para gestantes na rede pública de saúde.
O projeto nasceu da vivência de Cássia na maternidade, onde notou a falta de informação de grande parte das gestantes sobre o trabalho de parto, o que acaba favorecendo experiências negativas. “Muitas gestantes chegavam sem muita informação e ficavam só à mercê da equipe. Então eu identifiquei que isso é uma coisa que eu poderia mudar de alguma forma”, relata a sergipana.
Diante da possibilidade de atendimentos de fisioterapia online, regulamentados durante a pandemia da covid-19, Cássia passou a estruturar seu projeto, que envolveu o desenvolvimento de apresentações e cartilhas; a gravação de 67 vídeos com exercícios; fichas de avaliação, entre outros materiais necessários para treinamento dos fisioterapeutas que vierem a assumir o serviço.
“A gente propõe que o atendimento seja iniciado a partir da 27ª semana, que corresponde ao terceiro trimestre da gestação, quando a gestante já vai estar com volume abdominal mais parecido com o momento do parto. Além disso, fazendo mais perto do parto, o corpo vai criar uma memória”, explica a fisioterapeuta.
O atendimento prevê cinco teleconsultas, realizadas semanalmente, e pode incluir um acompanhamento de preferência da gestante. “Tem um material também que a gente passa para as gestantes com os exercícios que já foram treinados em cada teleconsulta, para elas poderem experimentar em casa. Um acompanhante pode proporcionar um maior suporte emocional e físico. Não precisa ser o esposo, a irmã, a mãe, mas qualquer pessoa do convívio da gestante”, explica.
Um acompanhante preparado pode, por exemplo, auxiliar a parturiente nos movimentos do corpo que favorecem a expulsão, aliviam a dor e proporcionam uma experiência de parto mais positiva.
“Independentemente da via de parto, a gente prepara. Porque a gente quer favorecer o reconhecimento desse protagonismo da parturiente também. Outro objetivo é diminuir a chance de partos traumáticos, como tantos relatos que a gente ouve”.
Fisioterapia obstétrica na rede pública
Cássia ambiciona ver o atendimento de fisioterapia obstétrica ofertado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) a todas as gestantes do país. Sabe, porém, da dificuldade desta implementação. Por ora, acredita que as secretarias municipais de saúde tenham condições de ofertar esse serviço nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs).
“A fisioterapia online é um recurso novo que dá para acessar mais gestantes em diferentes localidades, com diferentes condições sociais e financeiras, porque a fisioterapia obstétrica ainda é um serviço bastante elitizado, realmente são poucas pessoas que têm acesso. Aqui na região de Londrina tem esse serviço pela UEL, mas nos interiores acredito que não tenha. A teleconsulta seria uma forma de alcançar mais mulheres em lugares distantes, que não têm condições de pagar um fisioterapeuta particular”.
“O que eu penso é as prefeituras colocarem nas unidades básicas de saúde. Tem que ter uma estrutura, pelo menos os computadores. Além disso tem as cartilhas de apoio para a gente conseguir, também, capacitar os fisioterapeutas, porque é proposto um atendimento individualizado. Penso nas UBSs porque é onde as gestantes realizam o pré-natal”.
A fisioterapeuta busca canais de diálogo com o poder público a fim de apresentar o projeto.


Benefícios da fisioterapia obstétrica
Compreender como se dá a movimentação do corpo, no geral e na hora do trabalho de parto. Para Cássia, este é o diferencial do fisioterapeuta obstétrico e o conhecimento que ele pode dividir com as gestantes.
“O fisioterapeuta tem todo o conhecimento da cinesiologia (relativo ao movimento do corpo humano), da biomecânica que vai favorecer esse trabalho de parto, assim como a preparação do corpo. Além das informações que a gente pode passar para a gestante, tem a parte específica da fisioterapia, que a gente explica como acontece o movimento da pelve, como acontece a descida, o encaixe do neném, quais movimentos ela pode fazer em cada fase do trabalho de parto; mostra como abrir o estreito superior da pelve, o estreito inferior – que no momento do encaixe do neném deve fazer um determinado tipo de movimento, para que abra mais em cima; na hora da expulsão vai fazer com que abra mais embaixo. E isso é um diferencial que os outros profissionais possivelmente não têm”, detalha.
“Seria ótimo se toda gestante tivesse acesso a um fisioterapeuta no trabalho de parto, mas isso não é uma realidade ainda no Brasil. A gente pode, entretanto, preparar a gestante com todas as dicas para ela já chegar sabendo o que ela consegue fazer, qual é o ideal, o que pode acontecer, se tem necessidade da oxitocina, entre outras medidas. Ela tem que saber que ela deve concordar com a conduta também, não é só o médico que induz. Se ela tem esse conhecimento, facilita”.
“Meu desejo de verdade é que fosse um serviço ofertado pelo SUS para um maior número de mulheres conseguir ter acesso.”
Faltam informações básicas
Cássia vivenciou a realidade de uma maternidade em um hospital universitário onde, segundo ela, o atendimento é mais humanizado. Porém, faltam informações para as gestantes. “Até informações básicas, tipo quais posturas elas podem adotar no período expulsivo, não só ficar deitada. Às vezes elas acham que é o normal e, do ponto de vista biomecânico, é a posição menos indicada”, ressalta.
Independentemente da via de parto escolhida ou indicada para a gestante, Cássia ressalta que a fisioterapia obstétrica traz inúmeros benefícios.
“A gente mostra como preparar o assoalho pélvico, fazer as contrações, para evitar o risco de lacerações no parto vaginal. E também nos casos em que a gestante vai para a cesárea ela pode experimentar o trabalho de parto, tanto para preparar o corpo até para a produção do leite materno. A preparação do assoalho pélvico também é importante para a vida, para prevenir incontinência urinária, que muitas vezes elas já até apresentam durante a gestação. Em tudo isso o fisioterapeuta obstetra pode atuar”.
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