Moradores do novo residencial, próximo à ocupação Aparecidinha, fizeram protesto para reclamar do valor do IPTU e de gastos com muro de arrimo
Texto e fotos: Nelson Bortolin
Conforme prometeram, moradores que foram sorteados pela Companhia de Habitação (Cohab) de Londrina para receber terrenos no Residencial Jequitibá (Zona Norte) realizaram um protesto no local no final da tarde de sábado (1).
Valores de IPTU e gastos com aterramento e muro de arrimo estão entre as principais queixas dos futuros moradores do bairro.
Quatro horas antes da manifestação, eles foram chamados para uma reunião na Cohab nesta terça-feira (4).
A maior parte dos contemplados no sorteio realizado em dezembro de 2021 vive na ocupação Aparecidinha, localizada em área particular ao lado do Jardim São Jorge, próximos ao residencial.
Recentemente, a Cohab divulgou que também trabalha na regularização e urbanização desta ocupação. O projeto beneficiaria dezenas de famílias não contemplados com terrenos no Jequitibá.
Ao convocar a reunião por WhatsApp, um integrante da companhia sugeriu que o ato fosse suspenso para não prejudicar o processo de regularização da Aparecidinha.
“Eu me senti ameaçada. Nosso protesto ia começar às 18 horas. Eles mandaram uma mensagem quatro horas antes dizendo que não seria bom, para não empacar o Aparecidinha. Acho que eles estão querendo jogar os moradores da favela contra os que estão indo para o Jequitibá”, critica Graziele Barbosa de Souza, contemplada com um terreno no novo residencial.
Representantes de cerca de 20 famílias estiveram na manifestação e mostraram à reportagem da Rede Lume carnês de IPTU que superam R$ 700. Para eles, os valores não são condizentes com sua condição social. A maioria vive de benefícios sociais.

Os terrenos foram avaliados pela Cohab em R$ 30 mil cada e ainda não começaram a ser pagos.
Este é o segundo ano em que os futuros moradores do Jequitibá, que ainda estão construindo suas casas, pagam o imposto.
“A Prefeitura disse que no primeiro ano não dava para mudar (2022), mas que em 2023 a gente ia pagar o IPTU social (previsto em lei a R$ 50). Mas os carnês vieram novamente com esses valores absurdos”, critica uma das manifestantes, Geani de Fátima de Barbosa.
“Você acha que uma pessoa que vive de Bolsa Família consegue pagar IPTU de R$ 600?”, questiona.

Protesto: tem morador arrependido

“Se eu soubesse que iam regularizar aqui (no Aparecidinha) eu não tinha investido o dinheiro lá (no Jequitibá). Aqui é melhor porque é perto do posto de saúde. Lá nem tem sinal de celular”, alega a babá Greice Crismara, que mora há 7 anos na ocupação e deu início à construção de sua casa no residencial.
Já Geani está preocupada com o valor das prestações dos terrenos. Na época do sorteio, a Cohab estimou que as mensalidades ficariam entre R$ 150 e R$ 180.
O financiamento deveria ter começado em janeiro deste ano, uma vez que a companhia havia dado um ano de carência para o início da cobrança. “Já fomos atrás para saber quanto vamos pagar, mas ninguém fala nada”, diz a moradora.
O receio é que o parcelamento venha num valor bem acima do previsto, como aconteceu com o IPTU.
“O nosso muro de arrimo, que ainda não terminou, vai ficar entre R$ 23 e R$ 25 mil. Se eu soubesse que ia gastar esse valor só com o muro, teria ficado no Aparecidinha mesmo”, conta Laís Catcheli. A construção da casa ainda está no baldrame, estrutura na qual ela diz ter investido R$ 7 mil. “Já gastamos mais que o valor do terreno”, conta.
Outro custo com o qual ela não contava é com 46 caminhões de terra que precisou jogar no terreno. Laís diz que tinha a opção de usar a terra doada pela Prefeitura, que foi tirada das obras do viaduto da Leste-Oeste, e está amontada num terreno ao lado do residencial.
“Preferi comprar terra porque essa doada pela Cohab veio muito suja, com muitas rochas. Talvez a gente gastasse ainda mais se precisasse perfurar as pedras durante a construção”, afirma. Laís alega ter gastado mais R$ 5 mil na compra de “terra limpa”.
Questionada sobre como tem conseguido manter a obra, ela responde: “A gente passa o cartão, parcela em 12 vezes, empresta o cartão dos parentes, chora para o pedreiro fazer mais barato”, explica.
Ela e o marido também fazem as vezes de servente de pedreiro porque não têm condições de pagar um outro profissional na obra.
O marido de Laís está empregado e ela cuida dos sobrinhos para ter uma renda no fim do mês.

Com BPC, sem isenção
Ana Carolina Alves da Silva, mãe de quatro filhos, sendo duas gêmeas com microencefalia, pegou um terreno plano e não tem gastos com muro de arrimo. Sua queixa é que, por lei, deveria ter isenção de IPTU já que tem duas pessoas com deficiência dentro de casa.
“Disseram que não dava para eu ter isenção no primeiro ano. Mas que teria no segundo. Mentira, meu carnê veio com o mesmo valor de todo mundo.”
Separada, ela não tem condições de arrumar emprego porque precisa cuidar das gêmeas. Vive de Benefício de Prestação Continuada (BPC), do governo. E recorreu a um empréstimo consignado do próprio BPC para tentar erguer a casa.
Já investiu os R$ 13 mil do empréstimo e não tem mais dinheiro para tocar a obra. Ela mora no São Jorge, onde paga aluguel de R$ 600. “Além de tudo, levei um calote do pedreiro”, conta.
Moradora vende carro e moto
O muro de arrimo que Graziele Barbosa de Souza precisou construir em seu terreno tem 1,90 metro de altura. “Gastei quase R$ 14 mil. Não sabia que ia precisar. Me disseram que dariam o alinhamento reto dos terrenos”, conta.
Se não precisasse ter gastado com o muro, ela acredita que os R$ 14 mil seriam suficiente para erguer dois cômodos e um banheiro da casa. “Mas agora vai demorar bastante para essa casa sair”, alega.
Ela já vendeu carro e moto para pagar a obra. “Fiquei a pé, o dinheiro acabou e precisei parar a construção.”
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