Militante histórico deixa legado de luta e representatividade pelos direitos da população negra de Londrina
Cecília França
Faleceu neste fim de semana Sebastião Francisco Rego, militante histórico do movimento negro de Londrina. Aos 64 anos, Tião, como era conhecido, sofreu uma parada cardíaca. Ele deixa um legado de luta e representatividade construído ao longo de décadas, além de seu trabalho primoroso como artesão. O sepultamento aconteceu neste domingo, às 16h.
Sebastião participou da estruturação do movimento negro junto a outros personagens históricos, como lembra seu cunhado, o professor Edmundo Novais.
“Tião representou a memória, o início. Um dos principais fundadores do movimento negro de Londrina, junto com tantos outros, muitos que já se foram, como Yá Mukumbi, Genivaldo, dr. Oscar. Ele já pegou aquela herança do dr. Oscar Nascimento, veio dando continuidade, nas décadas de 1980, 1990. Foi muito responsável por levar essas discussões a centenas e centenas de londrinenses, para que hoje a gente pudesse ter uma luta mais justa pelos direitos da população negra dentro de Londrina”.
O Partido dos Trabalhadores (PT) de Londrina e a Secretaria Estadual de Combate ao Racismo do partido, no qual Tião sempre militou, emitiram notas de pesar.
“Sebastião era coordenador da Central de Movimentos Populares do Paraná (CMP Londrina-PR) e membro da coordenação estadual, incansável nas várias lutas que lhe foram confiadas. O Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras perde hoje um grande combatente, aguerrido que lutou com fervor por justiça e igualdade.”, afirma a secretaria do partido.
“Militante das causas populares e liderança do movimento negro, Tião também foi filiado ao Partido dos Trabalhadores e como membro do diretório, contribuiu com a luta por uma sociedade mais justa e fraterna. Sua trajetória de luta e sua alegria estarão sempre em nossas lembranças.”, enfatiza o PT Londrina.
Maria José Barbosa, a Mazé, foi atraída para a militância por Tião e dividiu a luta com ele por décadas. Ela lembra que o período da pandemia da covid-19 dificultou bastante seu trabalho como artesão.
“Ele teve um infarto e precisou colocar ponte de safena. Continuou indo para o Calçadão, mas com um pouco mais de dificuldade. Nesse período de pandemia existia uma preocupação muito grande com ele, porque também era diabético. Ele ficou muito trancado em casa, voltou para o Calçadão, mas com mais cuidado”, relata a amiga.
Ainda assim, Tião não deixou a militância. “Ele precisou dar uma desacelerada, mas nunca deixou de estar nos movimentos”, ressalta Mazé. “Ele sempre se posicionava em relação a tudo, dizia tudo que precisava dizer. Ele sempre soube de que lado ele estava”.
‘Ele também tinha preocupação com a organização comunitária’
Mazé conta que se descobriu negra a partir do convite de Tião para a militância, no final da década de 1980.
“Eu era da Pastoral de Juventude e ele ligado ao movimento negro. Eu não tinha muita amizade com ele ainda, me convidaram e eu pensava ‘Sou morena clara’. Acabei chegando lá e me identificando com falas, que me fizeram descobrir a minha identidade”, relembra.
“O Sebastião sempre transitou com muito comprometimento e compromisso no movimento negro, mas ele acreditava sempre numa luta em que não se discutisse apenas uma questão. Vamos discutir o negro, mas e o negro e a saúde? O negro e a educação? E a moradia? Pensar não o negro num espaço fragmentado, mas como ser humano que tem tantas outras necessidades, que vivia da forma como vivia porque as políticas púbicas não se interseccionalizavam. Não se pensava todas as necessidades em torno dessa pessoa”.
Por isso, Tião também se engajava na organização comunitária. Ocupou espaços em conselhos municipais e estaduais de saúde e das cidades, por exemplo. Por meio desse trabalho, tornou-se uma liderança na região Norte de Londrina.
“Nas campanhas políticas, por exemplo, quem era o coordenador na região Norte era ele, porque fazia esse elo de ligação, era uma referência”, diz Mazé. Sebastião também integrou a coordenação nacional da Central de Movimentos Populares (CMP) e foi coordenador estadual da entidade, posto ocupado hoje por Maria José.
“Ele assumiu uns três meses atrás a coordenação da CMP no município. Estava organizando uma ONG pró habitação, com essa preocupação da questão da moradia”, revela a amiga.
Sebastião era casado e tinha duas filhas.
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