Rede Lume de Jornalistas

Assistência Social de Londrina sofre com contingenciamento 

Para 2026, prefeitura pretende reduzir orçamento da pasta em mais R$ 17 milhões

Paloma Ferraz, especial para a Rede Lume

Colaborou Cecília França

Foto em destaque: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

“Nós estamos com alguns atendimentos de famílias que a gente já não estava atendendo, mas agora vão precisar por conta do impacto do contingenciamento, porque vários benefícios já foram bloqueados. Se você puder ajudar de alguma forma, com leite, com fralda, alimento e remédio… Pra quem acha que os R$ 210 do BEE não faz diferença, aqui já bateu a falta”.

A mensagem acima foi escrita pela líder de um projeto social na zona Norte de Londrina e reflete o impacto do contingenciamento de recursos da Secretaria Municipal de Assistência Social, previsto pelo Decreto n.960, de 8 de agosto. Projetos e usuários da política já estão sofrendo. E para 2026, a Prefeitura de Londrina deve cortar R$ 17 milhões da pasta, conforme previsão da Lei Orçamentária (LOA) enviada à Câmara de Vereadores.

Em resposta à reportagem sobre esse quantitativo, porém, o núcleo de comunicação da prefeitura respondeu que o corte “Depende das receitas. São as receitas que vão determinar o orçamento de todas as pastas.”

Benefícios suspensos

O BEE (Benefício Eventual Emergencial), citado pela líder comunitária na mensagem, é um depósito mensal no valor de R$ 210, que auxilia na alimentação dos cadastrados e está suspenso, sem previsão alguma de retorno. O PMTR (Benefício Municipal de Transferência de Renda), destinado a complementar a renda de famílias em situação de vulnerabilidade, também está em atraso, sem maiores esclarecimentos dos órgãos pagantes.

Até mesmo o Cadastro Único (CadÚnico), uma ação do governo federal, foi impactado, já que as inscrições dos usuários dependem do município. Na lista de espera, aguardam mais de 3 mil londrinenses e, enquanto isso, famílias são surpreendidas diariamente com o bloqueio de seus benefícios.

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“O prefeito determinou o contingenciamento de gastos aqui em Londrina, disse que não tem dinheiro e que o orçamento do ano passado foi feito inadequadamente” conta a vereadora Paula Vicente (PT), em entrevista à Rede Lume.

“As secretarias precisavam enviar uma lista com o que iriam precisar e, ao que tudo indica, a Secretaria de Assistência não enviou essa lista a tempo, o que quer dizer que vão cortar o máximo que puderem. Quando você corta dinheiro da assistência, você corta o dinheiro de várias organizações da sociedade”, acrescenta a vereadora.

CadÚnico viabiliza acesso a benefícios sociais/Foto: Lyon Santos/MDS

Trabalhadoras denunciam

“Eu já soube de instituições que não receberam, por exemplo, o repasse da parcela do mês da subvenção. Então a informação de que algumas estão sendo contingenciadas procede”, conta uma trabalhadora de entidade social conveniada que preferiu não se identificar.

Outra trabalhadora da assistência social, que também escolheu não ser identificada, atesta os impactos para os usuários.

“Temos uma cota muito pequena do BEE para disponibilizar. Todo mês solicitávamos para pessoas que não tinham renda e agora estamos tendo que controlar, fazer uma lista para encaixar em determinado mês. Para o mês que vem já tem uma lista de espera muito grande. O pouco que a gente tinha, e já havia uma dificuldade, se tornou menos ainda.”

A trabalhadora comentou da dificuldade em realizar tarefas que eram simples, como a disponibilização de vales-transporte, que agora dependem de agendamento e consulta técnica. A colaboradora também falou sobre o CadÚnico.

“Usuários do CRAS estão sem agendamento para a renovação do cadastro e as que precisam do entrevistador na casa não estão sendo atendidas”.

A falta de profissionais capacitados tem feito com que os CRAS fechem cada vez mais cedo, segundo ela. “Está assustador. No começo do ano mais de 30 assistentes sociais saíram por conta do fim do PSS e os que passaram no concurso ainda não foram chamados”, revela. “Os usuários ficam sem saber se irão até o CRAS e serão atendidos.”


O que diz o Decreto

No Decreto que previu o contingenciamento, a prefeitura argumenta que as receitas no primeiro semestre de 2025 apresentaram crescimento de 7,8%, porém, inferior em 5,9% à previsão estabelecida na Lei Orçamentária para este ano. Diz ainda que o cenário exige “medidas de contenção para evitar o desequilíbrio fiscal”.

O orçamento da assistência para 2025, aprovado em 2024, era de pouco mais de R$ 134 milhões. A gestão atual fez ajustes, a partir da arrecadação e o valor caiu para R$ 111,6 milhões. Para 2026, concorde o projeto da LOA, a pasta terá R$ 117,7 milhões.


Situação grave

O bloqueio da verba orçamentária ainda em 2025 já compromete serviços essenciais, mas no ano de 2026, caso implementado o corte previsto de R$ 17 milhões, o dano pode ser ainda maior. A prefeitura diz que pretende enviar um substitutivo da LOA à Câmara de Vereadores, ainda não se sabe quais mudanças podem ser feitas.

A situação tem sido objeto de denúncia da vereadora Paula Vicente. “Para acessar benefícios é preciso estar inscrito no CadÚnico. Estão pagando a EPESMEL para fazer o cadastramento, porque demitiram o pessoal responsável por essa função. Sem o CadÚnico você não acessa sequer o Castramóvel, que é da prefeitura”, exemplifica.

Questionada sobre uma solução prática para lidar com o contingenciamento e atender a população com maior qualidade, a vereadora incentiva a mobilização pública.

“A única solução para que isso não aconteça é as pessoas se mobilizarem. O problema da assistência social é tão urgente e eu tenho sido a única pessoa a falar sobre. Enquanto os atingidos por isso não se mobilizarem, nós não vamos conseguir.  A gente precisa de uma mobilização geral”.

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