Por Carlos Monteiro*

Vamos viajar na garupa leve do vento macio. Em tempos de viagem rodoviárias, tinha o hábito de, no fim da tarde, me deslocar para a cidade que visitaria no dia seguinte. À tardinha, a temperatura ficava mais amena e, dessa forma, menos cansativa. Outra questão é que já amanhecendo no local seguinte, fazendo pouso por lá, o dia fluía melhor sem a correria de ter de acordar na madrugada, o que nunca foi um problema para mim, e viajar com os primeiros raios do Astro-rei, o que, convenhamos, mesmo com ar-condicionado no carro, não é nada confortável.

Nos bailes da vida ou num bar. O mais interessante disso tudo e, talvez, o principal motivo desses deslocamentos vespertinos estava em jantar nas churrascarias, pensões, cabarés, postos de gasolina, bares, restaurantes e tudo mais que servisse comida de primeira, fosse seguro, e, de quebra, tivesse um órgão elétrico Yamaha ou Korg tonitruante, com seu maestro, enfurecido, se sentindo o próprio Rick Wakeman.

Naturalmente em solo ou acompanhado de uma cantora ou de uma dupla. Música incidental.

Aprendi por observação e dicas colhidas ao longo do tempo, que os melhores locais para se comer na estrada são aqueles onde há muitos caminhões estacionados e, por conseguinte – o Aurélio que me desculpe, mas a palavra mais bonita da ‘Última Flor de Lácio’ não é libélula; é ‘conseguinte’ -, gente com fome procurando comida boa, preços justos e se possível, boa diversão. Nada como uma trilha sonora para embalar um bom jantar. Muitas vezes fiz lautas refeições ao som de Elis, Milton, Caê e Lô.

Consta na pauta, no Karma, na carne, passou na novela, está no seguro, picharam no muro. Estávamos atravessando os anos 1980.

Sinhozinho Malta e a Viúva Porcina, quando Regina Duarte era somente atriz e fazia rir o Brasil, eram protagonismo, ímpar, de uma Asa Branca, microcosmo antagônico do país não muito diferente do atual. Regina ali, já era prenúncio da Regina atual. Roque Santeiro parava terras tupiniquins depois do JN, naqueles quarenta minutos não se ouvia pio em lugar nenhum. Descobri que caminhoneiros, mascates e vendedores viajantes eram noveleiros e dos bons. Discutiam personagens, imitavam gestual, compunham falas, num laboratório realizado em meio a espetos-corridos (rodízio) e pratos-feitos. Se houvesse música ao vivo era o momento do intervalo. As caixas de som passavam transmitir, não mais os vaneirões, forrós, sertanejo e, na maioria das vezes, MPB para estrepituar a estrondosa gargalhada da viúva e o guizado-cascavel, emitidos pelo atrito entre o relógio e as pulseiras, de ouro, de Malta.

(continua…)

*Carlos Monteiro é cronista, jornalista, fotógrafo e publicitário carioca. Flamenguista e portolense roxo, mas, acima de tudo, umapaixonado pela Cidade Maravilhosa.

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