Vídeo divulgado pelo deputado estadual Renato Freitas mostra detentos sem atendimento médico e abandonados em enfermaria; Deppen nega denúncias

Cecília França

Imagem em destaque: Prints do vídeo divulgado pelo deputado Renato Freitas

Órgãos de defesa dos direitos humanos reagiram, nesta quarta-feira (31), à situação de pessoas privadas de liberdade no Complexo Médico Penal (CMP) de Pinhais, região metropolitana de Curitiba, denunciada em vídeo gravado pelos próprios detentos e divulgado pelo deputado estadual Renato Freitas (PT) nas redes sociais. No vídeo aparecem detentos com fraturas, escaras e infecções não tratadas. O Núcleo da Política Criminal e da Execução Penal (NUPEP) da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) estuda propor uma Ação Civil Pública sobre a situação dos detentos da unidade.

Em nota, a DPE-PR informa que o NUPEP solicitou, por meio de ofício, ao Departamento de Polícia Penal do Paraná (Deppen) a lista de todos os cadeirantes que estão no Complexo Médico Penal e seus respectivos prontuários. O núcleo vai analisar a situação jurídica e médica de cada um deles para planejar a estratégia mais adequada.

“O Núcleo estuda uma proposta de Ação Civil Pública, que deve abranger também as condições das pessoas com deficiência e gestantes no CMP.”, diz a nota.

A realidade dos detentos no CMP não é desconhecida da DPE-PR. O órgão informa que o Complexo tem sido alvo de inspeção da Defensoria e de outros órgãos há vários anos e que, por mais de uma vez, foi solicitada a interdição da unidade.

“Além das inspeções já realizadas pelo próprio Núcleo, a Defensoria acompanhou visitas, incursões e vistorias de vários órgãos, como do Conselho Regional de Medicina (CRM-PR), do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-PR). do Conselho Regional de Farmácia (CRF-PR) e da então Ministra Presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Rosa Weber, em 2023. A última inspeção realizada pelo NUPEP no CMP ocorreu no último dia 23 de janeiro na galeria de alojamento das pessoas em situação asilar.”

“O NUPEP informa ainda que ajuizou no dia 30 de outubro de 2023 um Pedido de Providências, que pede a interdição da unidade com objetivo de vedar a internação de pessoas em leitos psiquiátricos no estabelecimento. O Núcleo já atuou em pelo menos seis Pedidos de Providência que tratam de questões coletivas e estruturais do CMP. O Núcleo atua e atuou também em outras ações individuais, sempre reiterando a impossibilidade da permanência de pessoas na unidade e a necessidade de sua interdição.”

Ainda de acordo com a DPE-PR, em 2020 e 2021, o Complexo Médico Penal recebeu indicativo de interdição ética por parte do CRM-PR. Em 2022, a entidade de classe aplicou a interdição ética parcial, impedindo a entrada de novos pacientes a partir de 4 de abril. A interdição, porém, foi revogada de 2022 pelo Poder Judiciário. O NUPEP recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, mas ainda não há uma decisão sobre o recurso.

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Coped vai pautar tema

O Conselho Permanente dos Direitos Humanos (Copedh) do Paraná vai pautar a situação do Complexo Médico Penal (CMP) na próxima plenária, que acontece sexta-feira, dia 2, em Curitiba, e deliberar as ações. A presidenta do órgão, Bruna Ravena Braga, diz que o Conselho deve encaminhar as denúncias recebidas ao Tribunal de Justiça, Ministério Público, Defensoria e outros órgãos competentes.

“Porque a gente não tem caráter de justiça. Podemos fiscalizar, fazer a visita, fazer um dossiê avaliativo, encaminhar junto, em anexo ao ofício que vamos encaminhar para o CAOP (Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça), para  o GMF, que é o grupo de trabalho que trata do sistema prisional no Tribunal de Justiça, e todos os outros órgãos. E ficar em cima para ver o resultado. Também podemos pedir uma agenda com o Deppen para verificar esse fato, falar com a Secretaria de Saúde, porque ela que tem o papel principal nessa questão da saúde das pessoas que estão em sistema de privação de liberdade, e a gente também precisa entender um pouco do fluxograma em que o serviço tem que funcionar”, pondera Bruna.

Ela tem consciência de que a pauta do sistema prisional é ampla e tem demandas antigas e recorrentes. “A gente não vai conseguir exaurir essa pauta. Sabemos que o sistema prisional é falho para todos, que o sistema entende que o cárcere é punição e a gente precisa fazer entender que não é isso. Então a gente faz um trabalho intensivo”, finaliza.

A reportagem pediu pareceres dos ministérios dos Direitos Humanos e da Justiça sobre a situação e aguarda retorno.

Deppen nega denúncias

Em resposta à reportagem da Lume, a Polícia Penal do Paraná (Deppen) informa que o Complexo Médico Penal (CMP) do Paraná está em processo de reforma. “Recentemente, foram concluídas e entregues as obras de adequação e modernização da enfermaria e, no último mês, de uma ala ampla e arejada que tem atendido 43 pessoas privadas de liberdade. Há também um processo de licitação em andamento com recurso aprovisionado para reforma de mais duas galerias, trazendo mais conforto a 117 PPL’s”, diz a assessoria do departamento.

Sobre a situação do detento que aparece no vídeo com uma escara não tratada e sem fraldas, o Deppen afirma que o homem chegou à unidade recentemente e nega negligência.

“Esclarecemos que a PPL que é apresentada com escaras é oriundo de internamento hospitalar da cidade de Foz do Iguaçu e sua entrada no CMP é recente, de 19 de janeiro de 2024, sendo que seus curativos são devidamente trocados e higienizados diariamente, não havendo ainda a falta de fraldas conforme declarado.”

Sobre o detento que mostra uma perna quebrada, o Deppen afirma que “todos os atendimentos médicos de especialistas, seguem o agendamento da rede SUS, não havendo nenhum registro de cancelamento de escolta para o caso”, conforme dito no vídeo. “Por fim, às pessoas privadas de liberdade que não possuem visitas presenciais, lhes são disponibilizadas salas de televisitação para garantir o vínculo familiar.”

De acordo com o Deppen, o  quadro clínico do CMP é composto por 38 servidores da área da saúde. Em 2021, foram acrescidos, por meio de processo seletivo simplificado, a contratação de profissionais. Atualmente, são 122 servidores, sendo médicos (clínicos gerais e psiquiatras), técnicos de enfermagem, enfermeiros, nutricionista, psicólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, fisioterapeutas, técnicos laboratoriais e farmacêuticos bioquímicos.

“O CMP ainda conta com laboratório de análises clínicas em suas instalações para maior celeridade no tratamento dos pacientes.”, garante o departamento.

“Ressalta-se ainda que as unidades penais do Paraná passam periodicamente por dedetização e desratização, sendo que no CMP a última foi realizada em novembro de 2023, e a próxima já está agendada para o mês de fevereiro. A limpeza da unidade, bem como a entrega e o recolhimento da alimentação, é realizada por pessoas privadas de liberdade devidamente implantadas em setores de faxina que o fazem diariamente.”

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